Marillion – Somewhere Else

Intact | Importado | 2007

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Marillion – Somewhere Else

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

“Três álbuns a mais que o U2, dois a mais que os Beatles, e o mesmo número de lançamentos do Ramones. Um fato raro nos anais do rock.” É assim que o press release de Somewhere Else, 14º trabalho de estúdio do Marillion, traz à tona a importância da banda inglesa para o mundo da música. Claro, das três bandas citadas, apenas a liderada por Bono Vox e The Edge permanece na estrada, mas isso não desvia a atenção do ponto principal: o novo trabalho pode dar a Steve Hogarth, Steve Rothery, Mark Kelly, Pete Trewavas e Ian Mosley o reconhecimento que eles tanto merecem. “E nos quatro cantos do planeta”, como ressalta o texto de apresentação.

Apesar do otimismo, as chances de o Marillion voltar a desfrutar de um grande sucesso comercial são mínimas. Não que Somewhere Else seja um disco ruim, muito pelo contrário, mas a grande mídia há muito tempo não tem mais olhos para o quinteto. Uma pena, pois a música que temos em mãos possui muito mais alma e coração do que aquilo que se ouve nas rádios. E essa honestidade, diga-se, vem acompanhada de fãs absolutamente fiéis, que já chegaram a financiar um álbum (marillion.com, de 1999) ao comprá-lo antes mesmo de o grupo ter começado a compor suas músicas.

Para quem esperava uma nova investida no mundo pop, digamos assim, Somewhere Else é um balde de água fria. Apenas a ótima Most Toys, quarta faixa do CD, flerta com o que a banda fez tão bem em anos não tão distantes. O novo disco, na verdade, pega carona no progressivo intimista, e muitas vezes melancólico, que tomou conta de Marbles (2004). Vá lá que See it Like a Baby ainda apresente algum traço mais comercial, mas ainda assim se rende a melodias mais calmas (e não raro belíssimas), assim como The Other Half e A Voice from the Past, que são puramente Marillion. Ou seja, destaques para a excelente voz de Hogarth (ou ainda existe alguma viúva de Fish choramingando pelos cantos?), a elegância de Kelly nos teclados e o talento nas seis cordas de Rothery, cujo bom gosto nas seis cordas parece não ter fim.


Thank You Whoever You Are e a faixa-título estão entre as mais bonitas composições da banda, em alguns momentos lembrando o que de bom fez o Radiohead antes de passar a escrever música sem pé nem cabeça. Ou seja, o Marillion não tem medo de assumir influências contemporâneas, e isso vale também para algumas pitadas de Porcupine Tree. Quer mais um exemplo? No Such Thing e The Last Century for Man, ambas com construções harmônicas inteligentes, privilegiando a grandiosidade do arranjo no meio da canção (no caso da primeira) ou num fim apoteótico (a orquestração, digamos assim, na segunda).

Mas o melhor está mesmo nas excelentes The Wound, a prova definitiva de que o Marillion fica muito acima da média quando resolve ser rock progressivo, e Faith, que encerra o CD de forma acústica, como se fosse a trilha sonora perfeita para o fim do filme a que você acabou de assistir. Para não dizer que tudo são flores, Somewhere Else peca apenas em alguns refrãos exageradamente repetidos, como se fosse uma síndrome de Iron Maiden, mas nem de longe algo que comprometa a música feita com o cérebro e o coração. Para o fã, não para o grande público. Uma pena, afinal.


Resenha publicada na edição 133 do International Magazine, em junho de 2007