Grave Digger

Teatro Odisseia – Rio de Janeiro/RJ – 25/04/2019

Foto: Daniel Croce

Grave Digger

Por Daniel Dutra | Fotos: Daniel Croce

Não fazia tanto tempo assim, pois o Grave Digger havia pisado em solo carioca pela última vez no dia 6 de maio de 2015, no mesmo Teatro Odisseia, mas tempo suficiente para jogar por terra a desculpa “Ah, eu vi da última vez que a banda esteva aqui, há um ou dois anos” – como se isso fosse razão para deixar passar show de banda que você curte, diga-se. No entanto, o que explica a casa abarrotada há quase quatro anos e cheia de lugar vazio agora? E olha que estamos falando de um local pequeno, cuja capacidade oficial é de 398 pessoas… Enfim, cabem aqui várias teorias, e uma delas é completamente plausível: a crise econômica com altíssima taxa de desemprego no Brasil (e no Estado do Rio de Janeiro, onde tudo parece estar pior). No entanto, não dá para escapar de um fato: a cidade vem se transformando, nos últimos dois ou três, num cemitério para o rock pesado.

Mas enquanto algumas produtoras ainda fazem um trabalho heroico, vamos ao que interessa: a apresentação de Chris Boltendahl (vocal), Axel Ritt (guitarra), Jens Becker (baixo) e Marcus Kniep (bateria), que tocaram como se estivessem à frente de uma multidão – o que se espera de profissionais e, claro, de um grupo com quase quatro décadas de história. Com a figura do Ceifador no palco – óbvio, não? –, o quarteto abriu os serviços com Fear of the Living Dead, uma das três faixas extraídas do álbum mais recente, The Living Dead (2018), e por isso mesmo não deixou de ser uma agradável surpresa ver os fãs presentes com o refrão e o coro na ponta da língua. O que aconteceu também em Blade of the Immortal, a quinta música do set, mesmo que num grau menor de empolgação.

E se um show tem pouco público, fica a certeza de que os que saíram de casa são realmente fãs da banda. Assim, as vozes presentes continuaram soltas em Tattooed Rider e… Bom, os refrãos cantados com vontade tiveram a companhia de um “Olê, olê, olê! Digger! Digger” entre boa parte das músicas. O tradicional e já manjado coro começou antes de The Clans Will Rise Again; entrou por Lionheart; arrancou um sorrisão de Boltendahl momentos antes de The Dark of the Sun, e por isso mesmo o público aumentou o volume; começou a ficar chato ao anteceder Call for War; felizmente perdeu força nos anúncios de Circle of Witches e Rebellion (The Clans Are Marching)”; e voltou com força total depois de Healed By Metal, primeira canção do bis.

Não dá para dizer, então, que o pouco público não fez barulho. Fez, e fez muito, facilitando a retribuição que vinha do palco. “É um prazer voltar a essa bela cidade, e vamos dar muito metal germânico para vocês”, disse o vocalista antes de anunciar The Clans Will Rise Again, na qual pediu o coro de “rise”no refrão e foi prontamente atendido. O clima era tão bom que Boltendahl se divertiu até mesmo ao precisar anunciar Lawbreaker duas vezes, uma vez que Becker ainda tentava resolver um problema no baixo – apesar disso, faça-se o registro: o som estava muito, muito bom –, sem esfriar os ânimos do público, que vibrou com The Bruce (The Lion King) logo a seguir.


Vestindo um casaco jeans repleto de patches de bandas (mais old school, impossível), Boltendahl fazia muito bem o papel de regente enquanto a banda dava o suporte musical necessário, apesar da discrição de Becker, que tira um som bonitão do seu baixo Fender, e do apenas correto Kniep – e vamos dar um desconto, afinal, de 2014 até 2018, quando substituiu Stefan Arnold, o cara era o tecladista do Grave Digger. Além do The Reaper, é claro. Assim, sobra para Ritt a responsabilidade de preencher os espaços que o vocalista não consegue, e o guitarrista não decepciona. Tem uma presença de palco empolgante e, apesar de deixar a desejar nos solos, brinda os fãs com uma mão direita de respeito. Suficiente para fazer jus ao trabalho rítmico de gente melhor do que ele, como Manni Schmidt e Uwe Lulis – e com o perdão da sinceridade, o riff funkeado de Lionheart ficou ainda melhor com Ritt.

De volta a Boltendahl, o mestre de cerimônias mostrava no contato com a plateia por que é o coração e a alma do Grave Digger. “Essa é uma das minhas favoritas”, disse ele antes de The Curse of Jacques, que colocou os fãs para “cantar” o dedilhado inicial. “Vocês gostam de metal germânico? Então essa é uma música bem rápida”, mandou na lata ao anunciar War God, que até abriu uma rodinha na pista. “Vocês querem mais força e poder? Mais metal germânico? A próxima é um clássico, uma canção muito mística”, avisou o vocalista, cujo orgulho de suas origens metálicas foi traduzida na reação dos fãs, que sabiam se tratar de Excalibur e enfiaram novo sorriso no rosto de Boltendahl com uma participação marcante.

E o veterano frontman mal sabia que aquele não seria o grande momento da noite. Isso ficou reservado para Rebellion (The Clans Are Marching). “É a última da noite, mas é uma música especial, sobre liberdade. Sobre lutar pela liberdade”, lembrou Boltendahl, que não escondeu a expressão de felicidade ao testemunhar os fãs cantando sozinhos o início do clássico, no momento mais legal da noite, tanto que o vocalista pediu bis. Ah, sim: ainda teve o Ceifador – ou The Reaper, como queiram – no palco empunhando uma gaita de fole. E não foi a última da noite, obviamente, uma vez que os fãs ainda tinham pela frente o protocolar bis. Ainda assim, o Grave Digger não poupou munição: voltou ao palco para mais quatro canções. Enquanto Healed By Metal, com seu refrão verdadeiramente bacana, se mostrou uma das favoritas do público, The Last Supper deu uma leve baixada no clima.

Curiosamente, diga-se, porque ela veio na sequência da ótima Zombie Dance, que Boltendahl, numa entrevista ao autor desta resenha, na manhã do show, disse ter sido motivo de criticas à banda. Bom, ao anunciá-la, presente em The Living Dead, o vocalista deu a deixa para entender por que alguns fãs reagiram negativamente: “Vamos tocar uma música na qual misturamos dois estilos. Vocês querem dançar?”. Pronto. Dançar. Sacou? Felizmente, parte da plateia mostrou não ser conservadora e entrou na brincadeira, fazendo até coreografia no “Step to the right / Step to the left” e “Jump to the right / Jump to the left” do refrão. Uma descontração mais do que necessária para o óbvio encerramento com o hino Heavy Metal Breakdown, que, aí sim, levou todos os fãs ao delírio – ao ponto de um subir no palco e arrancar o único semblante de irritação de Boltendahl em toda a noite –, num encerramento de festa que, vamos relembrar, merecia mais pessoas presentes. Quantos fãs cariocas do Grave Digger ficaram em casa?

Setlist
1. Fear of the Living Dead
2. Tattooed Rider
3. The Clans Will Rise Again
4. Lionheart
5. Blade of the Immortal
6. Lawbreaker
7. The Bruce (The Lion King)
8. The Dark of the Sun
9. Call for War
10. The Curse of Jacques
11. War God
12. Season of the Witch
13. Highland Farewell
14. Circle of Witches
15. Excalibur
16. Rebellion (The Clans Are Marching)
Bis
17. Healed By Metal
18. Zombie Dance
19. The Last Supper
20. Heavy Metal Breakdown