Brother Firetribe

AOR clássico em tempos modernos: Pekka Ansio Heino explica o som de cinema e o novo álbum do Brother Firetribe, um dos grandes nomes do estilo

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Brother Firetribe

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Sabe aquele hard rock melódico que atende por AOR? Especialmente, aquele que parece saído diretamente dos anos 80 e que foi trilha sonora de um monte de filmes de ação daquela época? Apresento-lhes o Brother Firetribe, banda finlandesa formada por Pekka Ansio Heino (vocal), Emppu Vuorinen (guitarra), Jason Flinck (baixo), Tomppa Nikulainen (teclados) e Hannes Pirilä (bateria). Em seu quarto disco de estúdio, o ótimo Sunbound (2017), o quinteto apenas confirmou ser atualmente um dos melhores nomes do estilo. Mas enquanto você procura o CD para conferir o trabalho do grupo, vamos passar a palavra a Heino (nota: a entrevista foi realizada no dia 6 de abril de 2017, e uma versão reduzida foi publicada na seção Cenário da edição 229 da Roadie Crew, em fevereiro de 2018. No mês seguinte, a íntegra entrou no site da revista).

Sunbound foi lançado três anos depois de Diamond in the Firepit. Nem é tanto tempo assim para os padrões atuais, mas houve alguma mudança considerável durante esse período?
Musicalmente, não há diferença. Pensando em tudo o que fizemos até hoje, sempre fizemos da mesma maneira. A começar pelo processo de composição, porque escrevemos as músicas de modo espontâneo e depois as lapidamos até que soem suficientemente boas para nós. Aliás, a questão principal sempre foi deixar a nós mesmos satisfeitos, antes de qualquer outra coisa, e tudo o que você escuta nos álbuns é 100% material que surgiu naturalmente. Não ficamos pensando e analisando demais, apenas fazemos aquilo que nos satisfaz e achamos bom. Se as músicas têm boas melodias e são pegajosas, então lançamos. Se as pessoas gostarem, é um bônus. Comparando Sunbound a Diamond in the Firepit, e para mim é difícil fazer isso, porque estou muito ligado às canções, o que vem à mente é a sonoridade do álbum. Os caras que mixaram os discos anteriores (N.R.: além de Diamond in the Firepit, de 2014, também o segundo álbum, Heart Full of Fire, de 2008), Torsti Spoof e Jari Mikkola, se tornaram os sexto e sétimo integrantes do Brother Firetribe, mas ficou claro que eles não poderiam se envolver com o novo álbum, por causa de seus próprios compromissos e situações de vida. Tivemos que procurar alguém que pudesse dar conta desse tipo de música, e nosso velho amigo Mikko Karmila foi um achado. O cara já trabalhou com bandas que vão de Rammstein a Stratovarius e Children of Bodom, e o trabalho que ele fez conosco foi incrível. A banda nunca soou tão bem, mas também acredito que fomos muito felizes no que escrevemos para Sunbound. Adoro Diamond in the Firepit, que tem ótimas canções, mas desta vez sentimos que o clima e o estado de espírito estavam tão bons que, desde o início do processo de composição, sempre que terminávamos uma música éramos motivados a começar a próxima. É por isso que o disco se chama Sunbound, porque durante todo o caminho, da composição à gravação, parecia que estávamos indo em direção ao sol, algo realmente iluminado.

É interessante que você tenha citado o background do Mikko Karmila, porque eu diria que Sunbound é mais pesado que Diamond in the Firepit. Não que seja um disco de thrash metal (risos), mas algo na linha de Help is on the Way, uma canção mais hard rock do que AOR.
Você está no caminho certo, definitivamente. Help is on the Way até poderia estar em Diamond in the Firepit ou Heart Full of Fire, talvez em False Metal (N.R.: álbum de estreia, de 2006, relançado em 2008 como Break Out), mas algumas das músicas de Sunbound têm outro alcance em relação ao que o Brother Firetribe costuma fazer. Por exemplo, Phantasmagoria e Shock, e eu não saberia explicar por que ganharam essa forma. Acredito que elas são um desenvolvimento natural do nosso trabalho.

A música do Brother Firetribe tem um clima alto astral. Parte disso vem de uma sonoridade que remete à trilha sonora de filmes de ação dos anos 80, e não à toa vocês gravaram alguns covers, como Restless Heart no novo álbum…
(rindo) O Brother Firetribe é exatamente isso. Nossas músicas são baseadas nessas trilhas sonoras, basicamente. Todas as vezes que compomos pensamos sempre se o que estamos fazendo dará um empurrão no ouvinte, porque é dar aquela vontade sair por aí correndo (risos). Adoramos as canções dos filmes daquela época, então virou uma tradição ter um desses clássicos em cada disco. Gravamos Mighty Wings, que o Cheap Trick gravou para “Top Gun” (1986); Chasing the Angels, de Mike Reno para “Águias de Aço 2” (1988); Winner Takes it All, de Sammy Hagar para “Falcão – O Campeão dos Campeões” (1987); e agora Restless Heart, de John Parr para “O Sobrevivente” (1987). Fazemos essas versões, mas também procuramos sempre a energia dessas trilhas sonoras para o nosso próprio som.

Sim, porque o Brother Firetribe conseguiu construir a sua própria trilha sonora em Sunbound, com músicas como Taste of a Champion, Give Me Tonight e Don’t Cry for Yesterday. Ou seja, o mais legal é que a banda não precisa dos filmes de Tom Cruise, Sylvester Stallone ou Arnold Schwarzenegger (risos).
E seria maravilhoso se uma delas se tornasse realmente parte de uma trilha sonora. Você mencionou Taste of a Champion, e ela tem uma história curiosa. Estávamos no meio do processo de composição quando uma agência entrou em contato com o Tomppa, porque ela tinha um roteiro para o comercial de uma grande empresa finlandesa do ramo alimentício. Era uma campanha de TV cujo enredo era baseado nos filmes da saga “Rocky”, algo realmente anos 80 e com um orçamento generoso, então a agência precisava de uma canção que encaixasse perfeitamente. O título ‘taste of the champion’ já existia, então escrevemos música e letra em torno dele, mas não era para ser algo do Brother Firetribe. No início éramos apenas eu e Tomppa bolando algo para um comercial, mas ficou tão legal que mostramos aos rapazes, e eles fizeram suas partes rapidamente para transformar a ideia numa música da banda. E o vídeo é realmente muito divertido.


Você falou que as músicas saem naturalmente, e é impressionante como refrãos, backing vocals e melodias pegajosas soam como se vocês fizessem isso exatamente desde a década de 80. Last Forever, Strangled e Heart of the Matter são ótimos exemplos. Como é a criação do som do Brother Firetribe?
E é natural assim desde o primeiro disco. Todas as canções da banda começam numa colaboração entre mim e o Tomppa. Ele traz algumas ideias no teclado, como sequências de acordes e riffs, e eu procuro criar as melodias mais grudentas que puder, tanto para a música como para a letra. Uso um violão para compor e gravo tudo no meu celular, o mesmo que estou usando para falar com você (risos). Depois mando o que fiz para o Tomppa, aí começamos a trabalhar juntos para arranjar as músicas e suas estruturas básicas. As demos que fazemos têm apenas meus vocais, teclados e uma bateria programada, porque o restante dos rapazes escreve e acrescenta suas partes. No geral, o grande lance é que as canções deem liga do início ao fim, então nos preocupamos em fazer com que ela seja contagiante começando pelo verso, passando pela ponte e terminando com o refrão.

O que acontece com Shock, uma balada mais para o lado romântico como aquelas que ouvíamos nos anos 80. Sem querer soar repetitivo, pois acho mesmo que esse toque é o diferencial.
Sim, e é legal porque nunca havíamos feito algo como Shock. Ela é mesmo diferente, e sua introdução é toda do Tomppa. Fiquei entusiasmado quando ouvi, então comecei logo a trabalhar nas melodias e arranjos. O que tinha em mente era levá-la na direção de canções como Give in to Me, do Michael Jackson, e Flesh for Fantasy, do Billy Idol. Esse era o clima que buscamos quando a compusemos, e acredito que alcançamos um resultado muito bom. Adoro essa música.

Aproveitando, gostaria de falar de duas das minhas favoritas em Sunbound. A primeira é Big City Dream, uma música feita para grandes arenas e que, para mim, pode ser a nova I Am Rock do Brother Firetribe.
(rindo) Uau! Obrigado! Também adoro Big City Dream, e devo dizer que ela ganhou vida depois da mixagem final. Até então achávamos que era uma boa canção que começou no violão, mas que era algo básico demais para nós. No começo, não sabíamos como fazer um arranjo para ela, então trabalhamos muito duro para fechar todos os arranjos. Quando a terminamos, vimos que ela boa o suficiente para estar num disco do Brother Firetribe, mas foi apenas depois de mixada, e somente depois que escutamos todo o álbum pronto, que pensamos: “Puta merda! Big City Dream pode ser um hit!” Foi o nosso terceiro single, mas poderia ter sido o primeiro.

E a segunda é Phantasmagoria, que você mesmo mencionou no início. Ela é bem diferente das outras 11 faixas do disco, um cruzamento entre o melodic rock e o épico.
Ela tem uma história interessante, porque surgiu quando estávamos de férias, como banda mesmo. Estávamos em Miami, tomando gin tônica na varanda de um bar, quando Jason mostrou uma de suas demos para nós. Ele puxou o celular e disse: “Escutem isso, rapazes.” Era uma melodia que havia gravado na guitarra. Achei sensacional e pedi que enviasse logo para mim, porque eu começaria a trabalhar nela assim que voltasse para Finlândia. Quando cheguei em casa, abri o arquivo para ouvir e percebi que não era a melodia que havia pedido. Pensei “Que porcaria é essa? Isso aqui é muito ruim, não é o que ouvi” (risos), então tive que vasculhar todas as demos que ele havia enviado antes das férias. No fim das contas, encontrei o arquivo com a melodia que Jason mostrou em Miami e fiquei animado novamente. O que ele fez é a melodia do refrão de Phantasmagoria, e compus o restante da música no violão usando esse trabalho como base ao lado do Tomppa. Escrevi a letra em 20 minutos, dentro de um trem, e depois fizemos a demo exatamente da mesma maneira, apenas com vocal, violão, teclados e bateria programada para que o restante da banda fizesse a sua parte. Mas até o último minuto não sabíamos o que fazer com Phantasmagoria, uma boa música que ainda sentia falta de algo para levá-la a outro nível. Foi aí que surgiu a ideia de um arranjo de cordas, por isso chamamos Torsti Spoof, que atualmente faz arranjos musicais para filmes e tem belíssimos trabalhos no currículo. Ele escreveu um arranjo de orquestra maravilhoso, exatamente o que faltava para Phantasmagoria se destacar. O que Torsti fez foi realmente dar vida à canção.

Vocês regravaram For Better or for Worse no formato acústico como bônus para edição japonesa de Sunbound. É uma canção antiga (N.R.: a original está em Diamond in the Firepit), mas a nova versão ficou com cara de hit para as rádios. Foi essa a intenção?
É muito bom ouvir isso. Obrigado! Havíamos esquecido que o Japão precisa de material exclusivo, então tivemos de tirar uma música do álbum para deixar como bônus do CD japonês, e a escolhida foi Don’t Cry for Yesterday. Ainda assim, não foi o suficiente, só que não tínhamos mais nenhuma canção nova. Como eu toco For Better or for Worse numa versão acústica nos meus shows solo, sugeri aos rapazes que poderíamos fazer o mesmo, acrescentando percussão e algumas outras coisas. E ficou muito bom, bem relaxante e alto astral. Apesar de ser uma regravação, acredito que é algo especial para os fãs.


Indelible Heroes é mais do que uma homenagem a Lemmy, Prince e David Bowie, então a escolha para ser o primeiro single e videoclipe foi ideal. Como surgiu a ideia?
Cara, 2016 foi um ano muito triste por causa da quantidade de ícones que nós perdemos. São pessoas maiores que a vida, porque se você analisar o que acontece hoje em dia no mundo e na música como negócio, ninguém tem mais a oportunidade de se tornar tão grande e ser uma lenda. Não acontece mais isso. O que esses artistas fizeram foi algo único, e eu nunca fiquei pensando que um dia poderiam morrer, pois eles estavam sempre presentes, mas de repente alguns deles começaram a ir embora. Isso realmente mexeu comigo. Quis fazer um tributo para mostrar meu respeito por eles e pelo que deixaram para nós. Acredito que o resultado ficou bem legal.

Sem dúvida, e você meio que respondeu a minha próxima pergunta. A morte de Lemmy ainda mexe com as pessoas, por exemplo, e será sempre assim. É natural que nossos ídolos vão embora, mas também assustador.
Exatamente! Essa é a questão, porque quem vai ficar para dar continuidade ao que eles fizeram? Quem é capaz disso? Ninguém. Nunca haverá alguém como Lemmy, com o status que ele tinha. Claro, não é apenas o Lemmy no mundo do rock e do heavy metal, mas todo mundo o conhece. David Bowie? Prince? O que esses caras fizeram na música foi especial e sem igual, e ninguém jamais vai conseguir duplicar.

E vocês regravaram Hungry for Heaven, música de outra lenda, Ronnie James Dio. Mas o mais interessante é que a canção se encaixa perfeitamente no estilo do Brother Firetribe.
Eu nem lembrava mais disso até o momento em que você trouxa à tona. (risos) Hungry for Heaven foi gravada porque alguém havia nos convidado para participar de um tributo ao Dio, mas não me recordo se foi antes ou depois de sua morte…

… Foi antes, em 2008.
Isso! Você sabe melhor do que eu (risos). Deveria ter entrado nesse tributo, mas não sei o que aconteceu (N.R.: a versão acabou lançada no EP Heart Full of Fire… And Then Some, no mesmo ano). Sabe, Ronnie foi o melhor vocalista de heavy rock que já existiu. Tenho enorme respeito por ele e sou grande fã do Rainbow e da sua própria banda. E foi o que você falou, tínhamos que escolher uma canção que tivesse a ver com o Brother Firetribe. Com todos aqueles teclados, Hungry for Heaven foi a escolha ideal.


Já que falamos de heróis, e você mencionou a importância do Dio como vocalista, quais são suas influências? Quem o inspirou e ainda o inspira?
Cresci ouvindo todas as grandes bandas de hard rock e AOR dos anos 70 e 80, então são elas as minhas maiores influências. Journey, por exemplo, e antes de qualquer outro tenho de citar Steve Perry, porque ele é o melhor de todos. Ninguém consegue superá-lo. Mas a lista continua com Lou Gramm e Foreigner, Joe Lynn Turner, que tem uma voz incrível, David Coverdale e vários nomes óbvios. Mas há alguns mais obscuros, como John Waite, que gravou com o Bad English. Adoro a maneira como ele canta. Não é aquele lance heroico do heavy metal, mas há algo no jeito como ele interpreta as letras, parece que está falando através da música de um jeito bem melódico. Acho maravilhoso. Sou um fã de música em geral, então não me limito apenas ao rock. Escuto muito soul antigo e Frank Sinatra, por exemplo, por isso procuro pegar um pouco de cada coisa para criar um estilo próprio.

O Brother Firetribe tem shows agendados para abril, vai participar de festivais no verão europeu e confirmou algumas datas para o fim do ano. Alguma chance de sair da Europa?
Não no momento, mas estamos procurando por todas as oportunidades possíveis. O Brother Firetribe nunca teve tantos agendados como em 2017, então poder não apenas tocar na Finlândia e em alguns festivais de verão é incrível. Temos uma turnê europeia programada para começar em outubro, então este ano está basicamente cheio. Mas existe alguma chance de novas datas no fim do ano e em janeiro de 2018, por isso qualquer coisa é possível se houver uma demanda. Queremos tocar em qualquer lugar.

E com o Nightwish tirando um período sabático (N.R.: todo o ano de 2017, voltando aos palcos apenas em março de 2018), talvez fique mais fácil ir a outros lugares, como o Brasil, porque o Emppu estará livre.
Absolutamente! Nós temos um ótimo feedback do Brasil, recebemos pedidos de fãs para tocarmos aí, e eu adoraria que isso acontecesse. Adoraria levar nossa música ao vivo para vocês, acredite.

E apesar de as duas bandas serem completamente diferentes, musicalmente falando, o Nightwish é muito popular por aqui. Isso ajuda, além do fato de que Sunbound foi lançado no Brasil.
Sem dúvida. Na verdade, não tem como negar que ter o guitarrista do Nightwish na banda ajuda bastante em qualquer lugar (risos).

Por último, já são oito anos desde o lançamento de Circus Colossus (2009). Como está a situação do Leverage?
Obrigado por perguntar! Cara, já passou todo esse tempo? (risos) Bom, não nos separamos, não sentamos para conversar e decidimos acabar com a banda, mas o que acontece é que colocamos tanto esforço em Circus Colossus, passamos um ano e meio trabalhando nele e fizemos o nosso melhor álbum. Ficamos muito orgulhosos dele e estávamos pronto para trabalhar ainda mais duro depois do lançamento, mas a gravadora (N.R.: Spinefarm Records) praticamente matou o disco ao não fazer absolutamente nada para promovê-lo. Uma situação comum, mas que nos deixou completamente desmotivados. Todos nós fomos fazer outras coisas, e é o que temos feito desde então. Ainda mantenho contato com todos os rapazes, porque os adoro. São músicos incríveis. Podemos voltar a fazer algo juntos um dia, quem sabe?, mas não num futuro próximo. (N.R.: o Leverage tem três discos – Tides, de 2006; Blind Fire, 2008; e Circus Colossus, 2009 – e um EP – Follow Down That River, 2007 – lançados. A banda é completada por Torsti Spoof e Tuomas Heikkinen, guitarras; Pekka Lampinen, baixo; Marko Niskala, teclados; e Valtteri Revonkorpi, bateria).

Obrigado pela entrevista, Pekka, e sinta-se à vontade para uma mensagem final.
Eu é que agradeço pela oportunidade de divulgar o Brother Firetribe. Para mim, é realmente significante estar na Finlândia e poder falar ao telefone com você no Brasil, saber que os fãs brasileiros estão prestando atenção no nosso trabalho. Isso é notável, mesmo. Então, para todos vocês que acompanham o Brother Firetribe, quero dizer que estamos mais do que prontos e dispostos a tocar no seu país em algum momento. Assim como nós estamos fazendo, cruzem os dedos.

Clique aqui para acessar a entrevista original no site da Roadie Crew.