Mãos à obra, Scott Rockenfield

Slave to the System e rock progressivo: outras facetas do baterista do Queensrÿche

Foto: DBAR Productions/Divulgação

Mãos à obra, Scott Rockenfield

Por Daniel Dutra | Fotos: DBAR Productions e Divulgação

O ano de 2002 não foi dos melhores para o Queensrÿche. Depois do anúncio da saída do guitarrista Kelly Gray, o que se viu ou leu foram rumores, trocas de farpa, dúvidas sobre o novo trabalho e incerteza quanto ao futuro da banda. A ausência nos palcos só foi quebrada no dia 31 de dezembro, numa apresentação especial de réveillon em Anchorage, no Alaska. O anúncio da volta de Chris DeGarmo em fevereiro deste ano começou a colocar a casa em ordem, precedendo uma sequência de boas notícias. A confirmação de shows em alguns festivais de verão na Europa, o CD chegando às lojas em julho e a tour de force que era o sonho de nove em dez fãs de progressive metal: Queensrÿche, Dream Theater e Fates Warning juntos numa turnê que, a princípio, será um privilégio apenas dos americanos.

As peças estão se encaixando, mas antes disso Scott Rockenfield não ficou de braços cruzados. Foi o integrante mais ativo do Queensrÿche durante todo o ano. Experiência solo não faltava, principalmente depois dos dois bem-sucedidos trabalhos ao lado do guitarrista Paul Speer: TeleVøid (1998), trilha sonora de um curta de animação gráfica que valeu aos dois uma indicação ao Grammy, e Hells Canyon (2000), obra instrumental de rock progressivo.

Slave to the System, o melhor do rock’n’roll

O primeiro passo surgiu com o Slave to the System, uma iniciativa de Kelly Gray e do vocalista/guitarrista Damon Johnson (Brother Caine). Rockenfield comprou a ideia, que acabou se transformado em mais do que um projeto com as chegadas do baixista Roman Glick (também do Brother Cane) e de Scott Heard (guitarrista/vocalista do Sweaty Nipples). Lançado de forma independente, Slave to the System é um excelente disco de rock, pesado e acessível na medida exata.

Stigmata, Ruby Wednesday, Desinfected, Zero e a excelente faixa-título dão conta do recado e comprovam o alto astral do disco, com ótimas linhas vocais, refrãos de extrema competência e riffs e levadas absolutamente empolgantes. Com o mesmo salto de qualidade, Leaves mostra uma faceta groove, Gone Today e Walk the Line têm um imenso potencial radiofônico, e as baladas trazem um belo trabalho na forma de Will You Be There, Love this Life e Abyss (as duas últimas muito, muito bonitas).

O hiato no Queensrÿche propiciou ao grupo espaço na agenda para algumas apresentações, que se tornaram um aquecimento para o próximo disco. Sem Glick, com o baixo a cargo de Johnson nas gravações, o Slave to the System vem passando um bom tempo num estúdio em Seattle preparando o segundo álbum. É uma das bandas de rock mais legais surgidas nos últimos dois anos.

Decepção progressiva

Primeiro trabalho inteiramente solo, The X Chapters – Theatre of the Mind é a prova da paixão de Rockenfield pelo rock progressivo. A satisfação fica ao gosto do freguês, mas infelizmente o batera se espelhou no que há de mais chato no estilo. Há bons momentos, como em Opening Title, Theatre of Mind e September (que faz menção à belíssima Chasing Blue Sky, gravado pelo Queensrÿche como bônus da versão japonesa de Hear in the Now Frontier, de 1997), mas as maiores influências são o chatíssimo Mike Oldfield, responsável pelo quase sonolento Tubular Bells (exceção feita ao tema que virou trilha sonora de “O Exorcista”), e o não menos chato Tangerine Dream.

Totalmente composto, arranjado e tocado por Rockenfield, The X Chapters – Theatre of the Mind é uma verdadeira decepção. Melhor ficar com o disco duplo e interativo Performance Series Drum Loop CD, uma coletânea de seus mais famosos licks e arranjos de bateria para a música do Queensrÿche. É a prova de que, entre (muitos) acertos e (poucos) erros, Scott Rockenfield sempre foi um baterista de técnica e criatividade excepcionais.

Artigo publicado na edição 92 do International Magazine, em abril de 2003.