Por Daniel Dutra | Fotos: Bruna Mastrogiovanni e Daniel Croce
A quarta turnê no Brasil e o sexto show no Rio de Janeiro, sendo o quarto na capital. Este é o currículo carioca do Radio Moscow depois de sua recente passagem, então era de se esperar que o La Esquina tivesse casa cheia naquele 1º de abril. A verdade, no entanto, é que o feriado que culminou com o Domingo de Páscoa não ajudou, e a presença do público não foi das melhores. Azar de quem não foi prestigiar o trio americano e de quebra assistir a dois novos nomes do cenário brasileiro.
E sorte deste que vos escreve o evento ter atrasado pouco mais de uma hora para começar. Por motivos de irritação futebolística aos 47 minutos do segundo tempo, cheguei à Lapa depois das 18h15, quando o Auramental deveria ter subido ao palco. Resumindo, teria perdido o baita show do quarteto carioca formado por Bauer França (baixo), Paulo Emmery e Enzo Mastrangelo (guitarras) e Vicente Barroso (bateria).
“Nós somos o Auramental, e é isso aí. Vamos viajar”, anunciou Emmery antes de a banda – que até dias antes se chamava apenas Aura – começar um set arrebatador. Sem disco lançado, a única música com nome foi a que encerrou a apresentação, Aura, o single recém-laçado e que já está nas plataformas de streaming. Uma viagem, realmente, com um encerramento à la Black Sabbath vitaminado por algum alucinógeno. Mas o rock progressivo do grupo vai muito além disso, pois adiciona quando necessários groove, rock’n’roll e até mesmo fusion na linha do Dixie Dregs.
Difícil fazer uma separação, afinal, além de músicas ainda sem título, o Auramental aproveitou a noite para fazer jams que vá saber o que vão virar. Mas o resultado é coisa de gente grande. E enquanto Emmery e Mastrangelo vão além de riffs ocasionais, com um trabalho de guitarra que une camadas e texturas diferentes tocadas por cada um, França puxa o som com linhas sensacionais de baixo. É para ficar de olho e aguardar com expectativa lá em cima o primeiro disco da banda.
Com o álbum de estreia, Paisagens e Delírios, nas mãos, o Quarto Ácido teve a difícil missão de tocar logo depois de quem impressionou. E se o trio gaúcho – Pedro Paulo Rodrigues (guitarra), Vinícius Brum (baixo) e Alex Przyczynski (bateria) – acabou mesmo não conseguindo acompanhar seu antecessor no La Esquina, por outro lado cumpriu a missão de mostrar seu trabalho instrumental sem dispersar a atenção dos interessados em conhecê-lo.
Oriundo da nova sofra brasileira de stoner, o Quarto Ácido nem mesmo soa como a maioria dos grupos do estilo. E apesar de o seu som não apresentar grandes novidades, e talvez um vocalista evitasse o sentimento de déjà vu próprio em alguns momentos, é bem-vinda a fusão com elementos mais alternativos, heavy rock e certa pegada de Rush bem dos primórdios – aquele ainda com John Rutsey, ou seja, sem o lado mais virtuoso. Direto e objetivo, o trio mostrou qualidades em 33, que abriu o show, Delírio e, com destaque para Rodrigues, Pinot Noir e Marcha das Raposas.
Hora da atração principal, e Parker Griggs (guitarra e vocal), Anthony Meier (baixo) e Paul Marrone (bateria) deram ponto final ao feriado com um show relativamente curto, porém matador. A pegada do Radio Moscow ao vivo é simplesmente absurda, e o rolo compressor começou a passar logo de cara com New Beginning, a (quase) faixa-título do novo álbum – curiosamente, o set acabou privilegiando três dos cinco discos do trio: além do mais recente, lançado em 2017, Brain Cycles (2009) e Magical Dirt (2014) foram os contemplados.
Death of a Queen veio a seguir para mostrar o que acontece quando baixa o santo de Jimi Hendrix em Griggs, que fez justiça ao maior de todos os guitarristas no riff e em solos cheios de feeling. Aliás, foi isso mesmo que o líder do Radio Moscow continuou fazendo em These Days e Broke Down, tocadas na sequência, em performances de tirar o fôlego. O mesmo vale para a insana parte instrumental com solos cheios de pressão no meio de Rancho Tehama Airport, que realmente remete a Chinatown, do Thin Lizzy. E isso é positivo, convenhamos.
Mas não era apenas Griggs que roubava a cena, e talvez seja por isso que Meier se concentre em segurar a onda com seu Rickenbacker, porque Marrone toca como se estivesse possuído. Na dobradinha 250 Miles e Brain Cycles, que viraram uma só peça, o batera mereceu todos os holofotes. E ao lado de Griggs, comandou a levada das excelentes Deceiver e Before it Burns, cujo bônus são os riffs carregados de wah-wah. E foi com slide em mãos que o guitarrista mandou o hard blues City Lights, aperitivo para a cacetada Pacing.
E a coisa quase degringolou depois disso. O amplificador de baixo deu pau duas vezes, interrompendo a execução de The Escape, o que fez o trio decidir pular No Time – curiosamente, a única canção do set oriunda de The Great Escape of Leslie Magnafuzz (2011) – e ir direto para a última da noite, a espetacular Dreams, na qual Griggs teve motivo para extravasar em mais uma dose de solos arrepiantes, escorado por uma cozinha irrequieta. A despeito dos problemas técnicos no fim – porque o som no modestíssimo La Esquina estava bom, diga-se –, o Radio Moscow deu uma bela aula de rock’n’roll com as melhores referências dos anos 60 e 70.
Set list Radio Moscow
1. New Beginning
2. Death of a Queen
3. These Days
4. Broke Down
5. Rancho Tehama Airport
6. 250 Miles / Brain Cycles
7. Deceiver
8. Before it Burns
9. City Lights
10. Pacing
11. The Escape
12. No Time (não tocaram)
13. Dreams
Set list Quarto Ácido
1. 33
2. Manhã Sépia
3. Delírio
4. Serena Inquietude
5. Pinot Noir
6. Euphrates
7. Psychodelic Pilger
8. Marcha das Raposas
9. Feeling Dead
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