The Black Crowes – Live

Sum Records | Nacional | 2002

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The Black Crowes – Live

Por Daniel Dutra | Fotos: Reprodução

Discos ao vivo são complicados. Raros são os que deixam o fã absolutamente satisfeito. Basta olhar para a seleção das músicas para perceber que faltam algumas das favoritas, ao mesmo tempo em que não dá para entender como aquela canção insossa entrou. Em Live, álbum duplo que pode ser o derradeiro trabalho do Black Crowes, acontece muito disso. Independentemente do que entrou no CD, é garantida a aula de rock’n’roll puro, simples e empolgante. São 19 faixas que garantem a diversão, mas há espaço de sobra para muito mais.

Era de se esperar que houvesse um bom número de músicas de Lions (2001). É compreensível pelo fato de ser um registro da turnê de divulgação do último trabalho de estúdio, mas o disco é mesmo tão bom que as seis escolhidas se justificam. No primeiro disquinho, Midnight from the Inside Out, Greasy Grass River, Miracle to Me e Cosmic Friend dão muito bem o tom. Na verdade, provam que não havia mesmo mais necessidade de os irmãos Robinson e cia. – Chris (vocal) e Rich (guitarra), com Audley Freed (guitarra), Eddie Harsch (teclados), Andy Hess (baixo) e Steve Gorman (bateria) completando a turma – tentarem afirmação como uma grande banda de rock. Não há dúvida que se trata de uma das melhores que surgiram desde o início da década de 90, e o trabalho com o ex-Led Zeppelin Jimmy Page já provara isso dois anos antes, com o excepcional Live at the Greek.

Para completar os exatos 55 minutos da primeira parte, clássicos instantâneos como Sting Me, Sometimes Salvation e Wiser Time (numa versão maravilhosa, faça-se o devido registro), além de outras ótimas canções como Thick n’ Thin, Curse Diamond e… Bem, Girl from a Pawnshop é a representante solitária de Three Snakes and One Charm (1996), único disco que podemos classificar de irregular na carreira do grupo. A escolha ao menos foi boa, uma das poucas coisas que se salvam do marasmo daquele álbum de estúdio e que ganhou muito em cima do palco.


Alguém está se perguntando onde eles colocaram tanta coisa (no mínimo) boa nas nove faixas que restam? Pois bem, faltou muita coisa. O segundo CD tem aproximadamente 50 minutos, ou seja, meia hora de desperdício de espaço. Pior, não há uma música sequer de By Your Side (1999). Nada de Go Faster, Kickin’ my Heart Around, Go Tell the Congregation ou a faixa-título de um excelente álbum. Mas se não há remédio, vamos dar valor ao que temos. As duas melhores de Lions, Lickin’ e Soul Singing (como são ótimos os backings vocals gospel, e em todo álbum), estão presentes e levantam o ânimo. Black Moon Creeping e High Head Blues são ótimas, e Title Song, excelente. Bom, não tem Jealous Again e Thorn in my Pride, mas loucura maior seria deixar She Talks to Angels, Twice as Hard, Hard to Handle e Remedy fora do show. Como não poderia deixar de ser, as quatro estão arrasadoras e/ou sensacionais ao vivo.

Ouvir Live e ficar achando buracos pode até ser reclamar de barriga cheia. No fim das contas, o disco é bom pacas, mas poderia facilmente entrar para a história com um dos grandes álbuns ao vivo do rock. Uma pena que não tenha sido assim, não importa se pelo mau ambiente interno na banda, causado pelos atritos entre Chris e Rich Robinson, o anúncio de que Gorman pularia fora ao fim da turnê ou qualquer outra coisa, incluindo a tentativa de transformar Kate Hudson – atriz (lembra-se de “Quase Famosos”, de Cameron Crowe?) e esposa de Chris – numa nova Yoko Ono. Menos, menos…

A impressão que fica é que o trabalho foi interrompido antes do tempo – ironia das ironias, a coletânea lançada antes de Lions chama-se A Tribute to a Work in Progress (“Tributo a um trabalho em progresso”). Sejamos otimistas e fiquemos na torcida para que o legado do Black Crowes não seja um ótimo (porém insuficiente) Live. Que o futuro não traga lançamentos realmente pós-fim de carreira, mas álbuns inéditos e uma banda renovada. Enquanto isso, que os trabalhos realizados durante o hiato – Chris Robinson está finalizando seu primeiro álbum solo, New Earth Mud – sirvam mesmo de inspiração para uma volta.

Resenha publicada na edição 90 do International Magazine, em janeiro de 2003.