Audioslave – Audioslave

Sony Music | Nacional | 2002

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Audioslave – Audioslave

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Você se lembra dos lançamentos que ouviu em 2002? Já fez a tradicional lista dos melhores do ano? Pois bem, tire qualquer um dela e inclua o CD de estreia do Audioslave. Lançado em novembro, o disco que leva apenas o nome da banda foi um verdadeiro presente de Natal e justificou toda expectativa em torno da união dos remanescentes do Rage Against the Machine – o guitarrista Tom Morello, o baixista Tim Commerford e o baterista Brad Wilk – com o ex-vocalista do Soundgarden, Chris Cornell.

Quando Zack de la Rocha anunciou sua saída do Rage Against the Machine, em outubro de 2000, a grande dúvida era como seria possível substituir o carismático frontman. O RATM parecia ser o tipo de banda que não funcionaria sem um de seus ingredientes, algo plausível se levarmos em consideração não o direcionamento musical da banda, mas o temático. Rocha não era necessariamente um vocalista e, sejamos sinceros, deixava muito a desejar na hora de acompanhar o instrumental do grupo. Em vez de cantar, ele discursava. Claro, sua metralhadora verbal não era dispensável, fazia parte de um todo e era inteligente no contexto político e social que o RATM adotou desde o início. Mas chegava uma hora que cansava.


Do outro lado, Chris Cornell havia lançado um trabalho solo depois que o Soundgarden encerrou as atividades, em 1997, o bom Euphoria Morning (1999). Sempre foi reconhecido como um ótimo vocalista e, ao contrário de Rocha, é adepto de letras mais pessoais, abrangendo conflitos, relacionamentos e perdas algumas vezes de maneira até abstrata. Poucos meses depois da ruptura no RATM, os boatos davam conta de uma união de forças dos três que ficaram com um dos ex-representantes da safra grunge. Mas a coisa demorou a engatar. Cornell chegou a abandonar o barco pouco depois de a banda, ainda sem nome, ser confirmada para o Ozzfest, mas voltou atrás e o supergrupo começou a tomar forma.

Felizmente, as diferenças de estilo entre Cornell e Rocha sepultaram o RATM. Com um novo vocalista de influências distintas, manter a alcunha seria uma atitude apenas e tão somente comercial. Civilian foi o primeiro nome a ser divulgado mundo afora, mas o quarteto fechou como Audioslave e agora chega às praças com seu disco de estreia. E que disco! Audioslave é um primor musical, uma mistura perfeita do que Soundgarden e RATM tinham de melhor. Pesado e acessível ao mesmo tempo, o álbum foi previamente anunciado pelo primeiro single, a excelente Cochise (responsável por um videoclipe espetacular).


A música abre o CD mostrando logo de cara quem são os maiores destaques da banda: Cornell e Morello. O primeiro está cantando uma barbaridade, numa mistura perfeita de técnica e feeling, e o segundo vale por meia dúzia de guitarristas, com riffs arrebatadores e ruídos e esquisitices que roubam todos os lugares que deveriam ser preenchidos por solos (e neste caso não foram, ainda bem). O trabalho dos dois faz com que Show Me How to Live e Set it Off tornem-se músicas maravilhosas, permeadas de peso e groove (cortesia também de Commerford nas quatro cordas).

Claro, há resquícios de RATM em vários pontos, assim como What Your Are e Bring Em Back Alive remetem ao Soundgarden. Mas a síntese não traz apenas resquícios de Black Sabbath, como em Gasoline, ou experimentalismos à la Led Zeppelin (uma referência muitas vezes percebida), como em The Last Remaining Light. Há sons retos e com refrãos fortes (Exploder e Light My Way), outros mais difíceis (Hypnotize) e também baladas, um lado inexistente no RATM e aqui mais bem explorado que no Soundgarden. Like a Stone, I Am the Highway, Getaway Car e Shadow on the Sun são muito bonitas, ideais para levar qualidade às emissoras de rádio. No entanto, não espere algo como a fórmula encontrada pelo Red Hot Chili Peppers, por exemplo. No Audioslave, tanto a banda quanto o disco, há de sobra o que vem faltando a muito grupo por aí: tesão para compor e gravar. Enfim, tesão para fazer música.


Resenha publicada na edição 90 do International Magazine, em janeiro de 2003.