Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação
O Rush nunca foi necessariamente um grupo de heavy metal, muito menos de rock progressivo, mas é inegável que seus primeiros discos exerceram imensa influência numa das muitas vertentes do rock pesado: o progressive metal. A definição inicial do estilo encontra-se no espetacular Rage for Order, lançado pelo Queensrÿche em 1986 – um álbum incompreendido à época, mas que provou ter sido um passo à frente com o reconhecimento conquistado anos depois. O prog metal, no entanto, também deve seu nome ao Dream Theater, que no início dos anos 90 o levou a outros patamares.
Lançado em 1992, Images and Words não pode ser apontado como um trabalho visionário, mas misturou com primor influências – e clichês – de bandas como Yes, Helloween e Marillion, entre outras, tornando-se um disco obrigatório. Foi o suficiente para que o quinteto americano virasse uma verdadeira febre, mas a consequência disso acabou sendo um tiro que saiu pela culatra. O Dream Theater é hoje um genérico do Iron Maiden, ou seja, sua legião de fãs não admite críticas negativas, e qualquer lançamento já nasce com o rótulo “obra-prima”.
Infelizmente, o exagero nos últimos anos fez com que altos e baixos fossem uma constante nos discos, mas nenhum deles poderia ser considerado abaixo da média… Até agora, já que Train of Thought é realmente difícil de engolir. Como torcedor de arquibancada não vira treinador, os fãs podem reclamar à vontade e usar novos e velhos chavões. Sim, Mike Portnoy (bateria), John Petrucci (guitarra), John Myung (baixo) e Jordan Rudess (teclados) são quatro dos melhores músicos do mundo, mas apenas técnica não é suficiente. Claro, o novo álbum é o mais pesado de toda a carreira do Dream Theater, mas até aí o seguro morreu de velho – que o diga o ridículo St. Anger, do Metallica.
O começo de Train of Thought é animador, mas serve para enganar o ouvinte. As I Am é uma música espetacular, com riffs inspirados, um ótimo refrão e melodias vocais muito bem encaixadas. O instrumental contido e elegante não é uma surpresa, mas curiosamente é Petrucci quem destoa do restante do time. Seu solo de guitarra é um exagero de notas tocadas à velocidade da luz e, pior, trata-se do episódio que deu origem à série. Ao ouvir todo o CD, a impressão que fica é que ligaram o gravador para Petrucci ficar solando alucinadamente por três, quatro minutos. Depois, apenas cortaram a fita e saíram distribuindo os pedaços.
Mas o sentimento de déjà vu não fica apenas nisso. This Dying Soul não se destaca por um desfecho que dá vergonha, mas pela quantidade de mudanças de andamento sem nenhum propósito e, principalmente, pelo nada inspirado solo dobrado de Petrucci e Rudess – Kevin Moore ainda faz muita falta, e Derek Sherinian foi injustamente execrado por grande parte dos fãs. Se antes havia espontaneidade de sobra, hoje as músicas com mais de dez minutos viraram fórmula para o Dream Theater. Não importa se as ideias não preenchem o espaço, porque o importante é enrolar para conseguir um CD de 70 minutos.
Apesar de suas guitarras plagiarem How Will I Laugh Tomorrow, do Suicidal Tendencies, Endless Sacrifice tem algumas passagens pesadas interessantes, por mais que Petrucci tente colocar tudo a perder com mais um solo sem sentido. Honor Thy Father coloca Train of Thought à beira do precipício, e Vacant chega para empurrar. Enquanto a primeira é disparada a pior música do disco, a segunda é mais uma prova de que James LaBrie nem estúdio vem convencendo – já que ao vivo ele está abaixo da média. A queda só não é maior porque a instrumental Stream of Consciousness tem bons momentos, e In the Name of God carrega boas melodias e só não tem um refrão melhor que As I Am – mesmo assim, impossível não registrar mais uma tentativa de Petrucci de estragar tudo, por isso fica difícil entender onde foi parar a classe e o bom gosto do guitarrista.
Resenha publicada na edição 100 do International Magazine, em janeiro de 2004.