Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação
O Helloween criou e ensinou, mas os alunos não aprenderam. Alguns até se saem razoavelmente bem, mas a maioria fez com que o metal melódico se tornasse uma subdivisão extremamente maçante dentro do rock pesado. Então, não surpreende que os alemães não apenas sejam referência, como também se mantenham entre os grandes do estilo. E o excelente Rabbit Don’t Come Easy é a prova cabal disso. “O ‘Happy Happy Helloween’ está de volta”, diz o vocalista Andi Deris, em entrevista para divulgar o décimo ‘full-length’ do quinteto. “Nós tínhamos de colocar a banda de volta aos trilhos. The Dark Ride (2000) foi apenas uma experiência, mas agora é diferente, pois estamos num ótimo momento. Muitas respostas estão no novo trabalho, e dá para entender por que certas pessoas não estão mais conosco.”
Deris não tem meias palavras e mostra-se bastante sincero ao comentar os problemas que culminaram com a saída em 2001 do baterista Uli Kusch e do guitarrista Roland Grapow, alvos da indireta acima. “O problema com Roland começou três anos e meio antes. Eu e Uli estávamos querendo tirá-lo da banda, mas Weiki (N.R.: o mentor e guitarrista Michael Weikath) deu uma segunda chance a ele. Não adiantou muita coisa. Uli acabou mudando de lado, e a situação se inverteu, por isso tivemos de fazer algo, pois cedo ou tarde eles precisariam sair. Naquelas circunstâncias, as coisas já não funcionavam mais, a química havia ido para o inferno. Depois do show no México (N.R.: no início de agosto de 2001, quando Deris ficou bastante gripado e algumas apresentações foram cancelados), decidimos que o Helloween deveria ser uma banda feliz novamente.”
Os dois ex-integrantes formaram o Masterplan – que lançou no fim de 2002 um ótimo disco homônimo –, e Andi não esconde uma, digamos, antipatia por Roland. “Eu precisei de dois anos para perceber que ele e Weiki não gostavam um do outro, afinal, nunca ensaiavam juntos, não se encontravam ou se falavam direito. Roland estava sempre interessado apenas no que ele compunha, ou seja, uma ou duas canções. E não era culpa nossa, mas apenas o fato de que ele não trazia à banda mais do que isso”, lembra o vocalista, que dá um exemplo concreto. “Durante a pré-produção de Better than Raw (1997), ele apareceu com apenas um riff e esperava que dele nós fizéssemos uma música. Eu simplesmente disse que trabalharia em algo que eu escrevi, não numa ideia que havia sobrado de seu disco solo.”
Sascha Gerstner (ex-Freedom Call) assumiu as seis cordas e tornou-se o orgulho do Helloween. “Ele tem 26 anos e cresceu ouvindo Helloween e minha ex-banda, o Pink Cream 69. Sascha é incrível, o melhor guitarrista que já ouvi. Você pode perceber tudo isso quando ele toca, e não digo isso porque ele está tocando comigo, mesmo porque nunca me referi ao Roland dessa maneira. Estou realmente feliz por tê-lo na banda, principalmente porque gostamos dele como pessoa, e ele se deu muito bem com o Weiki. Parecem até mesmo um casal (risos).” Para o lugar de Uli foi chamado o ex-Metalium Mark Cross, que contraiu uma doença chamada mononucleose, causada pelo vírus Epstein-Barr, e acabou sendo substituído por Stefan Schwarzmann (ex-Accept, UDO e Running Wild). No entanto, foi o magistral Mikkey Dee (Motörhead) quem assumiu as baquetas nas gravações. “Concordo com você. Ele é fantástico! Chegou ao estúdio sem a menor ideia do que teria pela frente, pegou as músicas com muita rapidez e fez um trabalho impressionante.”
E o disco? Vale a pena repetir: Rabbit Don’t Come Easy é arrasador, simplesmente o melhor trabalho do Helloween desde Master of the Rings (1994). Just a Little Sign, primeiro single e música que abre o álbum, diz tudo: levada empolgante, aquelas guitarras características (e únicas) e um refrão que você sai cantando sem precisar ouvir uma segunda vez. Tudo remete ao que o Helloween criou há mais de 15 anos. Exemplos? As ótimas The Tune, Hell Was Made in Heaven e Do You Feel Good; a balada Don’t Stop Being Crazy e Never Be a Star, faixa com acento mais hard; e as excelentes Sun 4 the World e Listen to the Flies (com um belíssimo solo de Gerstner).
Quer músicas mais pesadas? Escute Back Against the Wall e a espetacular Liar (com um dos muitos shows de Dee ao longo do disco). Uma para justificar estas linhas? A perfeita Nothing to Say. Pouco mais de oito minutos de riffs sensacionais (sem esconder a admiração de Weikath pelo ex-Deep Purple Ritchie Blackmore) e várias mudanças de andamento, incluindo uma passagem reggae como ponte para o excelente refrão e também uma parte lenta/instrumental belíssima no meio da canção. Resumo da ópera: Nothing to Say é o sinônimo de Rabbit Don’t Come Easy.
Resenha publicada na edição 93 do International Magazine, em junho de 2003.