System of a Down – Steal This Album!

American Recordings | Nacional | 26/11/2002

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System of a Down – Steal This Album!

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Pode uma banda lançar um disco simplesmente espetacular e as músicas que ficaram fora ainda formarem, pouco mais de um ano depois, outro trabalho de tirar o fôlego? Se o grupo for o System of a Down e se os dois álbuns forem Toxicity (2001) e Steal This Album! (2002), respectivamente, então a resposta é sim. A história é simples: as canções começaram a vazar na internet, e o novo CD chegou às lojas. Mas antes que alguém grite “oportunismo”, é necessário ressaltar que na Grande Rede circulavam as versões demo, e Steal this Album! tem produção sonora perfeita, a cargo de Rick Rubin e do guitarrista Daron Malakian.

O pirata chegou ao mercado na forma do disquinho prateado, mas até aí também não se discute a validade de ter na estante o CD original. Toxic Demos, um dos bootlegs mais conhecidos, tem capa digipack e produção bem bacana, mas basta olhar as músicas para ver quanta diferença. Quinze faixas contra 16, uma em duas versões diferentes – Thetawaves chamada de Waiting for You, com mudanças apenas no refrão e sua melodia vocal –, o restante também com nomes diferentes e duas canções bônus, Virgin Tea e Fortress (Outer Space), que todo mundo já deve ter baixado (menos eu, que paguei por uma cópia de Toxic Demos).

E por que vale a pena comprar Steal this Album!? Porque já é um dos melhores lançamentos do ano e serve de aperitivo para acalmar os ânimos enquanto Malakian, Serj Tankian (vocal), Shavo Odadjian (baixo) e John Dolmayan (bateria) não aprontam o quarto disco, previsto apenas para 2004. Chic ‘n’ Stu abre o CD mostrando o poder de fogo habitual do SOAD e um questionamento: é curioso notar como os descendentes de armênios fazem tanto sucesso com um som pouco (e muitas vezes nada) acessível. Melodia e (muito) peso aliados a partes rápidas, cadenciadas e lentas, com o versátil e ótimo Tankian ora agressivo, ora suave (provavelmente o vocalista mais próximo do excelente Mike Patton).


Na mesma linha estão as ótimas Bubbles, A.D.D., Pictures, Fuck the System, Streamline e Boom – que ganhou videoclipe dirigido por Michael Moore, vencedor do Oscar de Melhor Documentário por “Tiros em Columbine” (2002). Assim como o discurso inflamado de Moore, Boom traz imagens em que George W. Bush, Tony Blair, Osama Bin Laden e Saddam Hussein aparecem todos como farinha do mesmo saco. Além de músicas típicas da banda, há as mais suaves, como Ego Brain e a belíssima Roulette, e as que ficam no meio termo, exemplo de 36 (Tankian mandando muito bem), Highway Song e Nuguns, que tem a participação do percussionista Arto Tuncboyaciyan.

Entre tanta coisa boa, ainda dá para destacar as melhores: Innervision começa igualzinha a Roots Bloody Roots, do Sepultura, depois vira SOAD e se mantém empolgante como as duas bandas; Mr. Jack cresce para virar um verdadeiro arrasa-quarteirão, cortesia do andamento quebrado de Dolmayan com os riffs alucinantes de Malakian; e I-E-A-I-A-I-O tem um dos refrãos mais bacanas do rock nos últimos tempos, com Tankian numa interpretação, digamos, indígena de dar gosto. É ouvir e sair cantando e pulando.

Ah, sim: sabe o bootleg Toxic Demos? Não tem Innervision, Fuck the System, Ego Brain e Roulette. E também não dá para colocar no computador, acessar um site específico e ter acesso a letras e ficha técnica do disco. Steal This Album! não tem nem encarte, mas o que importa? Difícil é encontrar música mais bacana por aí. Não à toa o System of a Down é uma das melhores bandas surgidas nos últimos anos, e o que é ainda mais gratificante: sem a pompa enganosa de salvação ou futuro do rock.

Resenha publicada na edição 95 do International Magazine, em agosto de 2003.