Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação
Em 15 anos de carreira, o The Gathering nunca deixou de surpreender. As mudanças de estilo, no entanto, acabaram sendo pouco ou nada palatáveis no cenário heavy metal, com a velha história da perda de velhos fãs e a conquista de novos. A montanha-russa teve início com trabalhos bem mais pesados e rápidos – Always… (1992) e Almost a Dance (1993) –, que gradativamente foram perdendo o peso até a banda holandesa pisar de vez no freio e ser acusada de estar ouvindo muito Radiohead (com o perdão da sinceridade, o The Gathering é bem melhor).
A segunda e terceira fases da banda coincidem com a entrada da vocalista Anneke van Giersbergen no posto anteriormente ocupado por Bart Smits e Niels Duffhues – isso sem contar as participações de Marike Groot e Martine van Loon. O sucesso de crítica veio com Mandylion (1995) e Nighttime Birds (1997), mas foi com How to Measure a Planet? (1998) que o experimentalismo começou a incomodar os mais tradicionalistas. De If_then_else (2000) para o autointitulado trip rock praticado no último álbum de estúdio, Souvenirs (2003), foi mais um grande salto.
Independentemente do lado camaleão, o The Gathering nunca perdeu uma de suas características: a qualidade. Isso pode ser comprovado no ótimo Sleepy Buildings – A Semi Acoustic Evening. Nos dias 21 e 22 de agosto do ano passado, a banda subiu ao palco do Lux Theatre, em Nijmegen, na Holanda, para rever sua trajetória em canções especialmente rearranjadas para a gravação do CD semiacústico – curiosamente, não há nenhum material de Souvenirs.
Anneke (voz e violão), René Rutten (guitarra e violão), Hans Rutten (bateria), Frank Boeijen (teclados) e Hugo Prinsen Geerligs (baixo, substituído no fim do ano por Marjolein Kooijman) realizaram duas apresentações bem intimistas e repletas de momentos belíssimos. Apesar de Stonegarden e Eléanor serem mais animadas, digamos assim, o CD mantém um clima viajante do início ao fim. Sim, há forte influência de progressivo, notadamente Pink Floyd, em canções como The Mirror Waters, Red is a Slow Colour e a sensacional Travel.
Em um trabalho coeso, encontramos destaques na simples Saturnine (belo trabalho de Boeijen), nas viajantes Amity e Marooned e na ótima In Motion Part II, em que toda a banda tem participação mais ativa, destacando-se a guitarra de René Rutten. A performance da banda é correta em toda as 14 faixas – por problemas técnicos, The May Song e Nighttime Birds ficaram fora do disco –, mas é impossível não destacar o trabalho de Anneke, que dá um verdadeiro show em todas as músicas.
Sua voz angelical é reforçada em momentos realmente acústicos, seja acompanhada apenas do violão (My Electricity), do piano (Shrink, Like Fountains e Sleepy Buildings, esta a única inédita do CD) ou de ambos (Locked Away). Em Sleepy Buildings – A Semi Acoustic Evening – 11º disco do The Gathering, incluindo o ao vivo Superheat (2000), a coletânea Downfall – The Early Years (2001) e o EP Black Light District (2002) –, o grande destaque é realmente Anneke. Como todos os álbuns desde Mandylion, diga-se de passagem. Uma pena que os fãs brasileiros tenham o prazer de ouvi-la cantar apenas em CDs, uma vez que o The Gathering esteve no Chile no fim de fevereiro, para duas apresentações em Santiago, e uma passagem pelo Brasil nem sequer foi cogitada.
Resenha publicada na edição 101 do International Magazine, em abril de 2004.