Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação
Não é preciso ouvir o novo trabalho de Yngwie Malmsteen, Attack!!, para chegar à conclusão de que o maior problema do guitarrista é ele mesmo. O disco apenas ratifica o que todos que conhecem sua carreira já sabem, principalmente quem a acompanha desde o início. Em 1984, com 21 anos, o sueco impressionou com seu álbum de estréia, Rising Force. Não houve quem não ficasse de queixo caído com o que ele fazia com as seis cordas, criando um novo estilo, redefinindo a maneira de tocar guitarra no rock e, principalmente, no heavy metal. A velocidade era usada com inteligência; a influência de música clássica e barroca era aliada de maneira belíssima a um instrumental, digamos, mais pesado; e as composições eram um primor.
O impacto foi o mesmo em que arriscou comprar o vinil no Brasil, onde foi lançado quase dois anos depois. À época, o segundo disco, Marching Out (1985), já era encontrado em lojas especializadas em sua versão importada, e houve correria para conseguir uma cópia. Trilogy (1986), o trabalho seguinte, deu as caras por aqui quando o ex-Alcatrazz já era um fenômeno, de revelação a melhor guitarrista do ano em inúmeras publicações em todo o mundo. Hoje, ele continua sendo respeitado por sua contribuição à guitarra, mas tornou-se um músico extremamente chato, além de um sujeito de ego superinflado e detestado por boa parte da imprensa.
Attack!! – seu 18º disco, o 14º de inéditas – é mais uma prova cabal de tudo isso. São 15 músicas num álbum muitas vezes cansativo, poucas vezes realmente interessante. Ruim? Não, apenas indiferente. Provavelmente irá agradar ao fã mais recente, mas isso não basta. A primeira música, Razor Eater, seria melhor não fosse um dos três ou quatro solos que Malmsteen vem repetindo ao longo dos anos. Em Rise Up e Valley of Kings o autoplágio segue para as melodias vocais, absurdamente semelhantes. Assim, bastam três músicas para se perceber como o talento de Doogie White é desperdiçado.
Excelente vocalista, fato comprovado em sua passagem pela última encarnação do Rainbow de Ritchie Blackmore, White esteve com um pé no Iron Maiden. Na verdade, só não substituiu Bruce Dickinson porque aquele concurso foi mesmo uma armação para promover ainda mais o grupo inglês (como se isso fosse preciso). Em Attack!!, White se esforça – ou é indiretamente forçado – a cantar como Mark Boals, o ex-vocalista predileto de Malmsteen. O guitarrista é responsável por todas as músicas e letras, incluindo as linhas para voz, e aí você imagina como seria saudável se houvesse espaço para que outros membros pudessem compor. Mas o máximo que o ego de Malmsteen permite é a inclusão de um engenheiro de som, Tom Fletcher, responsável também pela mixagem. Ainda bem, pois quando o sueco se meteu a fazer toda a produção – em Alchemy (1999) e War to End All Wars (2000), os dois álbuns anteriores –, o resultado foi desastroso.
Enquanto White não realiza um trabalho com personalidade própria, é ainda mais difícil entender o que faz Derek Sherinian no disco. Tecladista de técnica bastante apurada e de grandes ideias (faça um favor a você mesmo e ouça o Planet X, banda instrumental que Sherinian tem ao lado de Virgil Donati e Tony MacAlpine), aqui ele serve apenas de pano de fundo musical. Não há um momento sequer digno de registro. Azar de seu substituto na turnê, Joakim Svalberg, que trocou os vários momentos Jon Lord que tinha com Glenn Hughes e Joe Lynn Turner para trabalhar para Malmsteen (sim, “para” e não “com”) – o próprio guitarrista assumiu o baixo nas gravações, o que é de praxe, e o batera Patrick Johansson completa a cozinha. Atualmente também de praxe, soltou a voz numa canção, Freedom isn’t Free.
Não, eu não me esqueci da música, mas a instrumental Baroque & Roll é uma desnecessária “releitura” da clássica Far Beyond the Sun, e Air, um tema em cima de vários temas de Bach, seria a melhor faixa do CD se Malmsteen a tivesse mantido acústica, da maneira que costuma apresentá-la nos shows. Tudo bem, tudo bem. In the Name of God, Valhalla, Iron Clad e a faixa-título são audíveis, mas Attack!! só vale mesmo pelas ótimas Ship of Fools, Stronghold e Touch the Sky. Para um padrão Malmsteen que já dura mais de dez anos, normal. Para um trabalho com 15 músicas, é muito pouco. A escolha é sua.
Resenha publicada na edição 90 do International Magazine, em janeiro de 2003.