Com a formação original, o Queensrÿche lançou apenas um registro ao vivo. Operation: LIVEcrime (1991) chegou às lojas no formato box set, com VHS e CD ou K7 acompanhados de um livro de 44 páginas contando a história da obra-prima Operation: Mindcrime (1988), álbum conceitual que foi reproduzido na íntegra na turnê do multiplatinado Empire (1990) – dez anos depois a caixa, já fora de catálogo, foi dividida na versão em DVD e no relançamento do CD remasterizado.
O guitarrista Chris DeGarmo pulou fora no início de 1998, e o grupo de Seattle começou uma segunda fase. Com Kelly Gray no posto, gravou Q2k (1999) e resolveu encerrar os mais de 16 meses de excursões com dois shows em sua cidade natal. Assim fora gravados o álbum duplo e o DVD Live Evolution. Mas Gray foi colocado para fora, e o Queensrÿche começava a entrar em sua MK III. Tribe (2003) até contou com a volta de DeGarmo, que resolveu não sair em turnê, e a banda acabou deixando a quinta vaga aberta a convidados.
Quem vem ocupando a posição é Mike Stone, e é com ele que o grupo lançou recentemente The Art of Live – o DVD saiu no dia 22 de abril, e o CD, no dia 8 de junho. O disquinho de áudio, aliás, nem estava programado, mas foi uma nova e agradável surpresa da Sanctuary Records, que já havia lançado Tribe também em DVD-Audio, incluindo um clipe ao vivo de Desert Dance. Apesar de não trazer o show completo, The Art of Live inteligentemente privilegia músicas do mais recente trabalho de estúdio e clássicos que não haviam entrado nos outros títulos.
Outro detalhe que acabou sendo positivo foi a opção pelo preto e branco. Na verdade, as imagens são em sépia – “envelhecidas”, ou seja, com aquele visual marrom e de película com anos de uso. Mais uma prova de que o Queensrÿche sempre procurou fugir do lugar-comum, o que é facilmente percebido na própria discografia. Tribe dá início ao show de maneira peculiar, com os integrantes entrando no palco um de cada vez – na sequência, Scott Rockenfield (bateria), Eddie Jackson (baixo), Stone, Michael Wilton (guitarra) e Geoff Tate (vocal).
Funcionou muito bem, assim como o resgate da ótima Sign of the Times, que em 1997 já versava sobre crianças indo armadas para o colégio e alertava para a delinquência juvenil. Em seguida, mais canções novas: Open, Losing Myself (a única mais ou menos de Tribe) e as excelentes Desert Dance e The Great Divide. Esta última bem representativa da temática lírica do álbum, que não poupa críticas ao presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, e a maneira como ele vem agindo desde os atentados terroristas de 11 de setembro – “Então estamos diante de uma grande divisão? / Há esperança para a América? / Pegue a bandeira que balançamos e a liberdade que cantamos / Sem respeito uns pelos outros / Elas não significam nada”.
Um dos melhores momentos vem a seguir, com o set acústico formado pela maravilhosa Rhythm of Hope, My Global Mind e Roads to Madness. Além da aula de Rockenfield na segunda, o formato ressalta mais uma vez o óbvio: Tate canta demais. A sensacional Della Brown é uma grata surpresa e mostra Stone em um belo solo, acompanhando o sempre inspirado Wilton. Breaking the Silence e The Needle Lies são as únicas representantes de Operation: Mindcrime, sendo que a reação da platéia não deixa enganar: é o disco favorito dos fãs. Best I Can encerra o show sendo mais um belíssimo resgate feito pela banda.
As músicas, a bem da verdade, foram tiradas das diversas apresentações realizadas durante a turnê com o Dream Theater, de junho a agosto de 2003. Assim, não poderia faltar algo da jam que os dois grupos faziam ao fim dos shows. Comfortably Numb (Pink Floyd) e Won’t Get Fooled Again (The Who) – perfeitamente substituídas no CD por Anybody Listening? – são realmente um deleite. Para finalizar, a resposta a uma provável pergunta: sim, James LaBrie some perto de Geoff Tate.
Resenha publicada na edição 103 do International Magazine, em junho de 2004.
Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação/Arquivo Pessoal (Maximiliano Santiago) e Mario Alberto (Banda Fusão)
Se você nunca ouviu falar em Maximiliano Santiago, saiba que a culpa é do destino. No fim de 2001, o Brasil ficou sem um de seus músicos mais promissores, um guitarrista que teve seu talento reconhecido por ninguém menos que Steve Vai. Aos 21 anos de idade, Max perdeu a luta contra o câncer, mas uma força de vontade e um brilho incomuns foram responsáveis pelo registro de sua obra. Enquanto você lê estas linhas, chega às lojas o CD …Definitivo, e para conhecer toda a história conversamos com o baixista Paulo Andrade, o baterista João Saravia (Sigma 5) e o tecladista Luiz de Simone (Sigma 5) – que formavam o Max e a Fusão – e também com o guitarrista Lula Washington (Allegro), convidado especial no disco e para o show de lançamento que acontece no próximo mês. E não deixe de visitar o site oficial (clique aqui) para mais detalhes.
Primeiramente, como foi o início do relacionamento musical? Paulo Andrade: Eu e Max entramos em contato um com o outro em meados 1999, porque ele queria tocar um projeto para frente. Voltamos a nos falar no ano seguinte, quando ele já havia feito a primeira cirurgia, e a ideia era tocar apenas covers. Começamos a correr atrás de músicos e completamos a banda com o Guto Perez (bateria) e o Daniel Matos (teclados). Fizemos uns dois ensaios para o primeiro show, que teve músicas de Jimi Hendrix, Stevie Ray Vaughan, Beatles e por aí vai. Mas o Guto tocava com um monte de gente e avisou que não poderia continuar, daí o Max chamou o João. João Saravia: Eu conhecia o Max há muito tempo, mas nunca havíamos feito nada juntos. Na época em que tinha uma banda chamada Black Market, ele veio a mim e ao Luiz com a ideia de fazer um show em conjunto com o Sigma 5. Entregou um CD para nós, e fomos assistir a uma apresentação dele. Eu já tinha visto Max tocar quando ele era mais novo e sabia que seria um bom guitarrista, mas na hora do show nós ficamos impressionados. Daí começamos a conversar sobre a possibilidade de tocar juntos, então ele montou o grupo com o Paulo e, quando o Guto saiu, me convidou. Paulo: Na verdade, o Max também havia falado comigo sobre o show dele. Na época, eu tinha uma banda de rock progressivo chamada Equinócio, e ele queria fazer uma noite com os dois grupos, o que acabou acontecendo uma vez em Vargem Grande. Antes, eu fui ao Garage vê-lo tocar com o Black Market e tive a mesma reação do João, pois o Max era carismático e tinha uma presença de palco inacreditável. Isso foi antes da doença, e ele estava supersaudável. João: Parecia que havia um holofote só para ele, que chamava atenção de maneira bem natural. Luiz de Simone: Eu fiquei hipnotizado com ele quando o Black Market e o Sigma 5 tocaram juntos no Black Night. Uns dois meses depois, ele foi assistir a um recital de piano solo que fiz na UFRJ, ficava falando que eu tinha de tocar com ele. Só que minha formação é mais clássica, por isso toco mais rock progressivo, e o lance blues meio jazz não é comigo. Tem de ter um sangue mais negão para conseguir o suingue e a pegada (risos). O Max ira fazer um show beneficente ao Inca (N.R.: Instituto Nacional do Câncer) e pediu que eu fizesse uma música para tocar com ele. Acabei escrevendo Cabo da Boa Esperança, um duo para guitarra e piano, mas o show não rolou. No fim de 2000, quando o CD começou a ser gravado, o Daniel saiu e eu entrei na banda. Acabou que nunca tocamos juntos ao vivo.
E o processo de composição e gravação do disco? João: A ideia era mesmo só tocar covers, mas sempre que eu entro numa banda todo mundo começa a fazer coisas estranhas (risos). No primeiro ensaio nós compusemos MM, uma música própria, aí acabou virando um projeto do Max em que fazíamos alguns covers. Ele e o Paulo estavam sempre se falando e chegavam no estúdio com novas ideias. Começamos a gravar depois da cirurgia, e o Max, além de ser muito jovem e ter aquele vontade de resolver logo tudo, sabia que o tempo era curto. Ele sempre marcava os estúdios e no fim já estava fazendo um esforço enorme para gravar, porque queria deixar tudo pronto. Lembro-me que nas últimas sessões ele já não aguentava de dor e tinha de tocar deitado. Paulo: A última música que o Max gravou foi Cabo da Boa Esperança, com o Luiz. A mãe do Max, dona Graziela, conta que ele chegou em casa dizendo que havia feito todas as guitarras, como se tivesse conseguido juntar toda a energia que restara apenas para finalizar o CD. Ele morreu logo depois, no dia 29 de dezembro. Aliás, no mesmo dia da Cássia Eller, que iria cantar no show beneficente. João: Três músicas são muito marcantes para mim: Ejaculação Precoce, Purerurim e Da Peste. Eles gravaram o baixo e as guitarras numa fita para que eu ficasse ouvindo, mas o Max fazia questão de ir à minha casa com o violão para me mostrar cada pedacinho das músicas, mesmo estando muito mal. Eu abafava a bateria, e ele ficava deitado tocando. Depois, ligava para o pai, seu Daniel, e ficava quieto na cama esperando por ele. A banda ensaiou uma única vez, passando umas três vezes cada música com o Max tocando sentado.
Como foi para a banda finalizar o álbum, chegar até o Lula para o show e tudo que está envolvido no lançamento? Tudo está saindo da maneira que o Max queria? Paulo: O CD era algo muito especial para ele. Dava para sentir que ele estava lutando contra o tempo para gravar as guitarras. Depois que o Max morreu, foi uma decisão unânime da banda e dos pais dele que deveríamos terminar o disco. Começamos a nos reunir para ver o que seria possível fazer para lançá-lo, e aí foram surgindo as parcerias. Há uma quantidade de pessoas envolvidas que nos surpreendeu. Todo mundo que se atrelou ao projeto apenas soube da história e se propôs a ajudar. Lula Washington: Eu não tive a oportunidade de trabalhar diretamente com o Max, até estava falando com o Paulo outro dia a respeito. Foi uma coisa muito doida. Eu assisti a um show dele com o Black Market meio que sem querer, pois entrei sem saber quem estava tocando. No fim, o Max esbarrou em mim no bar, e eu disse que tinha gostado. Meu contato com ele foi apenas esse. Tempos depois o Luiz me ligou perguntando se eu queria fazer parte do projeto… Luiz: … Nós precisávamos de um guitarrista que tocasse para caralho. Não sei por que pensei em você (gargalhadas). Lula: Até então eu não sabia de nada, o Luiz me contou toda a história e ainda me deu uma cópia do CD. Ouvi e entrei de cara porque gostei mesmo, apesar de o estilo ser diferente do meu.
E como rolou a ideia da participação em Mar (N.R.: faixa que conta também com a vocalista Léa Fabres)? Paulo: Na verdade, o CD teria apenas oito músicas, então Mar não entraria. Mas ela tem uma letra do Max, e nas reuniões nós decidimos aproveitá-la. Como não havia nenhuma gravação, pensamos em algo mais acústico. João: E precisava ser feito rapidamente, pois o disco estava quase pronto. Lula: Acabamos nos reunindo e começamos a fazer algumas jams só com baixo e violão. Eu trouxe algumas ideias de arranjos, e aí finalizamos o trabalho.
A música foi feita em cima da letra? João: Não, ela já existia, e chegamos até a tocá-la com o Max. Lula: Tinha uma guitarra, mas nunca foi gravada. Assim, voltamos tudo para o acústico e valorizamos o lance da letra. Paulo: Nós gravamos apenas voz, violão e baixo. Depois acabei comentando com o Cláudio Guimarães, que fez a mixagem e a masterização, que eu e o Lula estávamos pensando em colocar uma percussão. Um dia eu cheguei no estúdio, e ele me mostrou uma versão com a participação do Ricardo Costa, percussionista que já tocou com Ivan Lins, família Caymmi e mais um monte de gente. O Cláudio mostrou a música e contou a história, e o Ricardo topou gravar na hora. A percussão deu um novo colorido à canção e foi feita por um músico conhecido e excelente que não cobrou nada. Lula: Nós queríamos colocar, só não sabíamos quando conseguiríamos fazer. Aí aconteceu isso. Luiz: O cara chegou lá, pediu para apertar o “rec” e mandou ver. Precisávamos de uma percussão, e do nada alguém se dispôs a fazer. É um exemplo de como as parcerias aconteceram.
E como foi a participação da Léa Fabres? Paulo: O Max a conheceu quando os dois participaram de uma montagem da Dança dos Signos, do Oswaldo Montenegro. Eles fizeram uma temporada excursionando, e o negócio da Léa não era apenas teatral, mas também musical. Ela é uma excelente cantora e sempre era chamada para fazer algumas músicas com a banda. Os dois acabaram trabalhando em cima de uma poesia que o Max havia escrito, que virou a música Mar.
Falando em poesia, o Max também escrevia e pintava. Ele sempre teve essa lado voltado para a arte? Paulo: Ele tinha uma sensibilidade muito forte, era um garoto muito criativo. Eu ia sempre à casa dele para trabalharmos em alguns arranjos, e o Max vinha com algumas ideias fantásticas. Muitas vezes me colocava na rabuda, aliás, porque eu ficava quebrando a cabeça para descobrir como acompanhar (risos). Ele me mostrava os desenhos que fazia, e na parede tinha um incrível do Steve Vai, que era o grande ídolo dele. Ele tinha um lance que eu gostava muito, o de fazer caricaturas, pois sacava muito bem os detalhes das pessoas. Também escrevia poesias e começou a gostar da ideia de musicá-las.
E como tem sido tirar as guitarras, os solos e trabalhar em cima do que foi gravado pelo Max? Lula: Como eu não o conheci, entrei completamente pela música dele. De cara, peguei as canções que têm mais a ver comigo, que me atraíram mais. Eu gosto de tocar todas e não tive grandes dificuldades para assimilar.
Está seguindo tudo fielmente? Lula: Algumas coisas, sim. Não deixo de fazer nenhuma frase importante, mas existe aquele lance de improviso nos solos, e aí eu coloco algo mais com a minha cara.
Aliás, os solos do Max eram mais na base do improviso? Lula: Dá para perceber que foram muito bem pensados, mas eu toco o mais fielmente possível. Há os temas que têm de ser mantidos, pois fazem a música. Paulo: O Max tinha muito de improviso ao vivo. João: Nos shows era improviso total, ele nunca ficava preso a um formato específico. Paulo: E eu falei para o Lula que não tem como ele tocar igual ao Max. Seria impossível, até porque são duas pessoas completamente diferentes. Mas o grande lance de o Lula estar com a gente, além de tocar para cacete, ser supertalentoso e ter uma musicalidade tremenda… Lula: … Obrigado! (risos) Paulo: É que ele topou a história. Um grande lance que também fascinava o Max era que cada um tinha um estilo diferente. Eu venho de uma praia mais jazz e rock progressivo, o Guto tinha um suingue forte de música brasileira, e o Daniel era mais blues. Depois, o João entrou com uma pegada mais pesada. No começo eu até estranhei, mas a coisa foi ficando afinada, e hoje eu sou o maior fã dele… João: … Obrigado também! (risos) Paulo: É sério, eu sou fã de todos. O Luiz tem uma coisa erudita forte para caramba… Vou acabar babando ovo de todo mundo (mais risos). No fim, é algo bem definida para o som do Max, que é cheio de detalhes e muito redondo. Na época, isso era fundamental e preenchia a originalidade que o Max buscava. Essa diversidade de estilos fez o som.
Quem participou mais do processo de composição com o Max? João: A maior parte das músicas foi feita com o Daniel nos teclados. O Luiz pegou mais para gravar, à exceção de umas duas ou três em que trabalhou com o Max. Luiz: O Daniel já havia definido algumas coisas, e o Max me passava, mas eu tinha a liberdade de mudar o que eu quisesse. Acabei fazendo os arranjos da minha maneira. Paulo: Muitas coisas o próprio Max definia durante os ensaios, também, porque achava que não estava legal e pedia para fazer de determinada maneira. João: Apesar de ser um projeto do Max, ele um dia disse que não estava estava se sentindo confortável com isso. No entanto, nós deixamos bem claro que estávamos numa banda, mas que havíamos comprado a ideia de que a aprovação final tinha mesmo de ser dele. Nos gravamos motivados e envolvidos de uma maneira positiva, preocupados em fazer exatamente o que ele queria. Infelizmente, hoje estamos trabalhando para o show de lançamento e dando uma entrevista sem ele, que era a pessoas mais importante.
O CD será beneficente, e o dinheiro das vendas, revertido ao Inca. Como surgiu esse caminho? Paulo: Isso é muito importante. Quando ficou doente, o Max criou o Projeto Viver e Crescer, que passa às pessoas com câncer a mensagem de que elas não podem desistir. É um estímulo para fazer com que continuem criando sempre. Mesmo que haja algum obstáculo, é preciso seguir em frente. Max tinha 21 anos de idade quando morreu, mas mostrou uma maturidade incrível ao lidar com uma doença trágica. Era impressionante como ele era centrado mesmo tendo de conviver com aquilo. O projeto é uma parceria com o Inca, e toda a renda do disco será do Instituto, porque isso também era uma meta do Max. João: A história com o Steve Vai tem a ver como o Viver e Crescer. Um amigo em comum, o Pedro Bonfim, conseguiu um contato para chegar ao Vai e escreveu um e-mail, mandando uma foto que o Max tirou com ele num dos shows no Rio, falando do disco que ainda seria gravado e contando do projeto beneficente. O próprio Steve Vai respondeu, e eu tenho o e-mail guardado até hoje (risos), pedindo que enviássemos uma cópia. Nossa ideia era tê-lo participando em uma música, mas infelizmente não deu. No entanto, o Vai deu uma entrevista a uma revista brasileira e falou muita coisa boa do Max, provou que ouviu o CD e gostou.
E como será o show de lançamento? Será apenas um ou vocês pretendem levar para fora do Rio, por exemplo? Luiz: Será apenas um, a princípio, mas eu coloco a maior pilha neles três para fazermos outros, até para seguir com a música do Max. Queria até fazer uma música nova para o show em julho. João: Aliás, o CD sai em meados de junho e também será vendido na apresentação de lançamento. Paulo: Nós ainda não definimos o dia e o local, mas a Léa já confirmou participação, e, além das nove músicas do CD, iremos tocar vários covers: Mary Had a Little Lamb (Stevie Ray Vaughan), Little Wing (Jimi Hendrix), Detroit Rock City (Kiss), You’ve Got to Hide Your Love Away (Beatles) e Cry Machine (Steve Vai), entre outros. Certamente teremos mais convidados especiais, e iremos colocar no site oficial uando tudo estiver confirmado. João: E gostaríamos de agradecer a todos que nos ajudaram no projeto e ainda não mencionamos. André Coelho, baixista do Sigma 5 que mixou o disco; minha irmã, Viviane Saravia, que gravou todas as músicas, à exceção de Mar… Paulo: … Também ao Mario Alberto, que fez o site e a programação visual do CD, e a você pela força!
Entrevista publicada na edição 103 do International Magazine, em junho de 2004.
Quando o assunto é death metal melódico, não raro o primeiro nome que vem à mente é a do In Flames. Mais do que um dos grandes do estilo, o quinteto sueco atualmente é um dos mais bem-sucedidos grupos do rock pesado, tendo caído no gosto dos fãs graças principalmente aos excelentes Colony (1999) e Clayman (2000). Apesar de algumas injustas críticas a Reroute to Remain (2002), a banda formada por Anders Fridén (vocais), Jesper Strömblad (guitarra), Björn Gelotte (guitarra), Peter Iwers (baixo) e Daniel Svensson (bateria) ratificou ser um dos melhores surgidos nos últimos anos. Agora, lançar seu novo álbum, Soundtrack to Your Escape, que chega às lojas brasileiras via Nuclear Blast, para ao menos manter o prestígio conquistado. Para falar do trabalho e alguma coisa a mais, no dia 12 de março batemos um papo por telefone com Svensson. Confira o que rolou.
À exceção de Borders and Shading, não tive a oportunidade de ouvir o novo álbum. Assim, a faixa em questão representa o que está em Soundtrack to Your Escape ou há alguma diferença em relação a Reroute to Remain? Daniel Svensson: É realmente difícil imaginar um álbum tendo escutado apenas uma música, por isso posso dizer a você que Borders and Shading não representa Soundtrack to Your Escape. Nele há também músicas mais rápidas e uma canção que é uma power ballad, digamos assim. Na verdade, nós não mudamos tanto, apenas demos um passo à frente em nossa evolução desde Reroute to Remain.
Você concorda que o In Flames construiu um som único ao longo dos anos, algo que ficou ainda mais evidente desde Colony? Daniel: Bom, acredito que toda banda tem alguma coisa única. O In Flames é um grupo muito melódico, apesar de as melodias terem sido mais orientadas pelas guitarras nos primeiros álbuns. Agora, tentamos experimentar um pouco mais, e essas melodias aparecem nos vocais ou em sons eletrônicos. Elas sempre foram uma marca registrada da banda, e certamente continuaremos assim.
Quais são suas músicas prediletas de Soundtrack to Your Escape ou mesmo aquelas que você ache que irão funcionar melhor ao vivo? Daniel: Nós ainda não começamos a ensaiar para a turnê, mas compusemos o novo álbum imaginando como ele soaria ao vivo. Todas as músicas foram escritas para estarem em nossos shows, que são a coisa mais importante para o In Flames. Por isso nos preocupamos em ter essa vibração.
E como rolou todo o processo de composição e gravação? Houve alguma mudança em relação à bateria, por exemplo? Daniel: Sim, nós realmente fizemos as coisas de maneira diferente desta vez. A bateria foi gravada no estúdio do Daniel Bergstrand, que produziu alguns trabalhos do Meshuggah, e todas as músicas foram gravadas numa casa enorme que alugamos na Dinamarca. Construímos dois estúdios no local e certamente criamos um som único, que não pode ser reproduzido por nenhuma outra banda. Foi uma situação de trabalho bem diferente. Também realizamos uma pré-produção mais longa em maio, quando tivemos duas semanas para fazer uma demo com dez ou 11 músicas. Isso foi importante porque nos deu a liberdade de ouvir as canções e fazer algumas mudanças antes de realmente gravar o disco.
Quando Reroute to Remain foi lançado, muitas pessoas disseram que a banda estava se aproximando do new metal. Particularmente, não concordo, e músicas como Drifter, Egonomic, Dawn of a New Day, Metaphor e a faixa-título representam o In Flames de sempre. O que você acha disso? Daniel: (N.R.: rindo) Sinceramente, eu não dou a mínima para o que essas pessoas pensam (risos). Seja qual for o disco que lancemos, elas irão falar mal porque alcançamos um grande sucesso para uma banda de death metal. Isso é o que as incomoda. Podemos gravar um álbum bem extremo e ainda assim dirão que nos vendemos (risos). O problema não é como as músicas soam, mas o sucesso que conquistamos.
Fiz a pergunta porque a única resenha do novo trabalho que li dizia que vocês foram ainda mais fundo no new metal. Ela foi publicada numa revista brasileira, e aqui o estilo é adorado por alguns e odiados por muitos. Daniel: Eu ainda não li muitas resenhas, mas a maioria que chegou para mim era realmente favorável. As críticas negativas vêm dos fãs mais hardcore, que dizem muita coisa ruim a nosso respeito (risos). No entanto, não posso considerar Soundtrack to Your Escape um disco de new metal. Está tão longe disso quanto Reroute to Remain está de ser mainstream. Há uma música na velha escola do death metal no novo disco, e não dá para entender como podem chamá-lo de new metal. Como disse antes, vão nos acusar de falsos não importa que tipo de música o In Flames faça hoje, como se tivéssemos vendido um milhão de discos (risos). Esse é o problema.
O new metal é bem popular nos Estados Unidos e ganhou o mundo nos últimos anos. A comparação chega a incomodá-lo? Daniel: Infelizmente, as pessoas têm de rotular tudo. Eu não posso dizer que me recuso a ouvir new metal ou country music. Vejo a música como música, não importa o estilo. Quero saber apenas se é boa música. Há boas bandas de new metal, da mesma maneira que há algumas bem ruins. Eu não vou a uma loja atrás da seção de new metal, mas vou procurar boa música. O metal que o In Flames toca não era muito comum nos EUA, ao menos em 1999, quando começamos a fazer turnês por lá. Curiosamente, a maioria que tem falado mal é formada por fãs americanos. Não dá para entender. Nós escrevemos as músicas que queremos tocar e não podemos satisfazer cinco milhões de pessoas. Não dá para sair perguntando como cada um quer o próximo álbum do In Flames apenas para tentar agradar aos fãs. A coisa não funciona assim. Se você não gosta de um disco, não precisa comprá-lo (risos).
No meio dos anos 90, o metal melódico e estava em alta, e hoje o que vale é som mais agressivo, ainda que melódico. Isso se deve muito ao “Som de Gotemburgo”, algo que muitos atribuem ao In Flames. Você concorda? Daniel: Sinceramente, você pode dizer que sim (risos). Mas inclua também Dark Tranquility, At the Gates e algumas outras bandas que estavam ao nosso lado quando começamos a tocar death metal no início dos anos 90. Gotemburgo é uma cidade pequena, onde todos se conhecem, onde todos já tocaram uns com os outros, como se fosse uma grande árvore genealógica (risos). Por isso os grupos têm o mesmo estilo. Foi assim que começou o “Som de Gotemburgo” que tem influenciado tanta gente. Isso realmente me deixa lisonjeado.
Voltando a Soundtrack to Your Escape, ele será lançado em versão digipack com capa diferente. Além disso, há faixas bônus ou material multimídia, por exemplo? Daniel: Realmente serão duas capas diferentes, mas feitas pelo mesmo artista. O digipack terá uma música extra, gravada na mesma sessão do álbum e que, na verdade, é o bônus da edição japonesa. Apenas isso.
Recentemente, Anders Fridén gravou o primeiro disco do Passenger. Além disso, ele usualmente produz trabalhos de outras bandas. Você tem, atualmente, alguma atividade paralela ao In Flames? Daniel: Bom, eu toquei numa banda chamada Sacrilege, que gravou dois discos (N.R.: Lost in the Beauty You Slay, de 1996, e The Fifth Season, 1997) por um pequeno selo em Gotemburgo. Mas nos separamos quando entrei no In Flames (N.R.: em 1998), pois eu não conseguiria me concentrar cem por cento nos dois grupos. Atualmente, estou compondo para um projeto que deve ser lançado no próximo ano. É difícil descrever como é a música, mas posso garantir que é interessante (risos). À exceção da guitarra, irei gravar todos os instrumentos.
E você já tem em mente alguns nomes de guitarristas para ajudá-lo? Daniel: Como irei escrever tudo sozinho, provavelmente chamarei Jesper (Strömblad) e Björn (Gelotte) para gravar. É mais fácil assim, e sei que ficará bom (risos).
Já que não dá descrever o tipo de som do projeto, o que você costuma ouvir ou está ouvindo atualmente? Aliás, que bateristas e bandas serviram de inspiração para você começar a tocar? Daniel: No início eu ouvia muito death metal extremo, basicamente a cena da Flórida (N.R.: de onde saíram grupos como Death, Deicide, Malevolent Creation, Morbid Angel e Obituary). Também costumava tocar covers do Sepultura com minha antiga banda. Músicas do Arise e do Chaos A.D., discos que estão entre os 20 melhores para mim. Sempre acompanhei o antigo Sepultura. Não tive um baterista que tenha me influenciado a esse ponto, um ídolo específico. Sempre fui inspirado por todos os músicos que considero bons.
Você citou o “antigo Sepultura”. O que acha da banda com Derrick Green (N.R.: vocalista que substituiu Max Cavalera em 1998)? Daniel: Eu não tenho os discos com ele, apenas ouvi algumas músicas. Na verdade, não gostei tanto. Não é ruim, mas a banda não tem a vibração de antes.
O In Flames já lançou um álbum ao vivo (N.R.: Tokyo Showdown, em 2001). Há algum plano de fazer um DVD, já que o formato se tornou bastante popular? Daniel: Sim, e há alguns anos temos falado que devemos lançar um DVD (risos). Como os fãs têm de pagar cara por um, queremos fazer algo especial. Não apenas com um show, mas também com cenas de bastidores, o que acontece no backstage e outras coisas. Muitas pessoas assistem aos nossos shows, mas não sabem o que acontece quando estamos fora do palco. O In Flames está na estrada há mais de dez anos, então realmente está na hora de termos um DVD. Não temos uma data planejada, mas posso dizer a você que no máximo em dois anos iremos lançar um, definitivamente.
A turnê começa em abril, e alguns festivais já estão agendados para junho. Como estão os preparativos? Daniel: À exceção de um único show na Suécia, não tocamos ao vivo desde agosto de 2003 e estamos loucos para voltar às turnês! Como seremos headliners na Europa, faremos uma grande produção de palco e provavelmente teremos efeitos pirotécnicos. Tocaremos as músicas novas da melhor maneira possível, já que os fãs sempre esperam um grande show do In Flames. Eles pagam por isso, e nós damos tudo que temos para satisfazê-los. Hoje em dia é muito caro ir a shows, por isso não podemos decepcionar ninguém.
O In Flames deveria tocar no Brasil no fim de 2002. A turnê acabou sendo adiada para março do ano seguinte e depois foi cancelada. O que aconteceu? Daniel: Sempre recebemos ofertas para ir à América do Sul, mas eu realmente não sei por que ainda tocamos no Brasil. Acredito que o adiamento foi por causa de um outro compromisso nosso, mas não lembro qual. Como são os empresários e a agência de shows que cuidam dessa parte, infelizmente nem sempre sabemos o que está acontecendo. Sentimos muito por isso, ainda mais que tocamos no México e foi muito bom. Sei que aí seria ainda melhor, mas vamos ver o que acontece no futuro.
Além do Sepultura, você conhece mais alguma coisa do Brasil? Daniel: Apenas o Krisiun, mas sei que o público brasileiro é louco (risos). Há bandas que tocam em vários países e sempre mencionam a América do Sul como o local com os fãs mais insanos. Sempre leio isso nos jornais. Se nós damos o máximo nos shows mesmo que o público se mostre desinteressado, imagino a energia entre a plateia daí e a banda. Seria algo louco, e todos teriam uma ótima noite. Ah, sim: e também sou um grande fã de futebol! (risos)
O In Flames entrou na trilha sonora do filme “Freddy Vs, Jason” (N.R.: com a música Trigger, de Reroute to Remain), mesmo não sendo do cast da Roadrunner. Como aconteceu? Daniel: Para ser honesto, não tenho a menor ideia! Foi na internet que descobri que estaríamos no disco! (risos) De qualquer maneira, foi bom para a banda. É legal que eles tenham gostado de nossa música, já que a nossa gravadora é bem pequena nos Estados Unidos.
No release de Soundtrack to Your Escape está escrito “Isso é In Flames. Isso é o futuro”. O novo álbum é realmente o futuro para a banda? Daniel: Sem dúvida. Gostamos de experimentar bastante quando estamos compondo, pois não queremos nos repetir. Muitas pessoas gostariam que gravássemos um novo The Jester Race (N.R.: terceiro trabalho do In Flames, de 1996), mas não estamos interessados nisso. A cada álbum fazemos algo novo e interessante para nós mesmos. Independentemente de ser moderno ou de nunca ter sido feito antes, o processo é natural para nós, é como trabalhamos. Tentamos fazer algo diferente o tempo todo.
Obrigado pela entrevista, Daniel. O espaço final é seu. Daniel: Sinto muito que não tenhamos ido ao Brasil em 2002 ou 2003. Tentaremos incluir o país na turnê do Soundtrack to Your Escape. Não neste ano, mas no próximo. Queremos realmente conhecê-los e tocar para vocês. Obrigado.
Entrevista publicada na edição 102 do International Magazine, em maio de 2004.
Os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 afetaram o mundo da música de maneiras diversas. Sem contar concertos beneficentes e em nome da paz mundial, vários artistas e grupos lançaram trabalhos inspirados pelo acontecimento, fosse com um inflamado espírito patriótico (Bon Jovi e Bruce Springsteen) ou com críticas ao modo como o presidente dos EUA, George W. Bush, conduziu os eventos depois do ataque ao país.
A queda das Torres Gêmeas, a destruição parcial do Pentágono e o avião que caiu a caminho da Casa Branca afetaram também o Iced Earth, mas de uma maneira um tanto quanto peculiar. Guitarrista e líder de uma das bandas mais populares do heavy metal nos dias de hoje, Jon Schaffer resolveu dar maior vazão ao que antes havia feito apenas em duas músicas ― 1776, de Something Wicked This Way Comes (1998), e Ghost of Freedom, de Horror Show (2001). Ou seja, escrever um disco basicamente de temas históricos.
Se por um lado sua paixão por história ganhou forma por causa dos ataques, estes causaram a saída do vocalista Matt Barlow, que resolveu abandonar a música e tentar carreira como defensor público. O problema é que Barlow já havia feito todos os vocais do novo álbum, mas Schaffer decidiu que assim ele não seria lançado e convidou Tim Owens, que à época já convivia com os boatos da volta de Rob Halford ao Judas Priest, para regravar os vocais.
Apesar da reunião da veterana banda inglesa com Halford ter sido oficializada em julho do ano passado, Owens ainda fez um certo doce para aceitar ser o novo vocalista do Iced Earth, mas o casamento acabou sendo inevitável. Com tudo bem para os dois lados, The Glorious Burden foi lançado no início do ano e chegou recentemente às lojas brasileiras, via Century Media, que disponibilizou para os fãs o formato duplo do álbum, com o épico Gettysburg (1863) no segundo CD e a versão acústica da balada When the Eagle Cries ― anteriormente lançada no single The Reckoning.
Apesar de não ter conseguido superar o excelente Something Wicked This Way Comes, Schaffer e companhia produziram um grande trabalho, com mais altos do que baixos. Mais do que isso, a entrada de Owens, um dos melhores vocalistas de metal surgidos nos últimos dez anos, foi um salto de qualidade para o grupo, que conta ainda com Richard Christy (bateria), Ralph Santolla (guitarra) e James MacDonough (baixo).
Apesar de encaixado no contexto do trabalho, The Star-Spangled Banner, o Hino Nacional dos Estados Unidos, soa absolutamente desnecessário diante da atual política americana ― não à toa ficou fora da versão europeia de The Glorious Burden. Se o disco começa mal, felizmente o conserto foi rápido. A ótima e cadenciada Declaration Day, sobre a independência dos EUA; When the Eagle Cries, a única que fala de 11 de setembro; e The Reckoning (Don’t Tread on Me) formam uma trinca de encher os olhos.
Vá lá que Valley Forge e Hollow Man ― sobra de Horror Show e única que não aborda algum tema histórico ― não acompanhem o restante do álbum, mas ainda assim são boas músicas. No restante, a atuação impecável de Owens, os bumbos e as quebradas de Christy e os riffs de Schaffer são destaques em faixas empolgantes como Greenface (sobre os fuzileiros navais americanos), Red Baron/Blue Max (a respeito de Manfred von Richthofen, o Barão Vermelho, o mais famoso piloto de guerra alemão) e Waterloo (a derrota definitiva de Napoleão).
No entanto, o grande destaque é mesmo Gettysburg (1863), espetacular em seus 32 minutos divididos em três partes: The Devil to Pay, Hold at All Costs e High Water Mark. Contando os três dias – 1º a 3 de julho de 1863 – que deram início à Guerra Civil Americana, Schaffer compôs uma pequena obra-prima e usou a Orquestra Filarmônica de Praga para enriquecer belas passagens instrumentais, momentos intrincados e partes pesadas com a mesma eficiência. Só ela já valeria The Glorious Burden, mas Owens ainda faz o favor de abrir a boca e deixá-la ainda melhor.
Resenha publicada na edição 102 do International Magazine, em maio de 2004.
Idealizado por Joe Satriani, o projeto G3 ganhou os palcos pela primeira vez em 1996, contando com Steve Vai e Eric Johnson. Simples e eficiente, a ideia era realizar uma turnê em que cada guitarrista fizesse um set mais curto e, no fim, todos se juntassem no palco para uma grande jam. Deu certo, e no ano seguinte chegou às lojas o CD e o vídeo (na época era VHS mesmo) G3 Live in Concert. O negócio ficou tão sério que as excursões se tornaram constantes e abertas a um novo e terceiro guitarrista, uma vez que Satriani e Vai têm cadeira cativa ― fora alguma eventual e rápida ausência deste último.
Kenny Wayne Shepperd, Adrian Legg, Michael Schenker, Uli Jon Roth, John Petrucci (Dream Theater) e Robert Fripp foram outros nomes que participaram do G3 ― alguns duas vezes: Shepperd, em 1996 e 1997; Fripp, em 1997 e de volta em 2004 para shows na Europa; e o próprio Eric Johnson, que reapareceu em 2000. Apesar dos vários nomes respeitáveis, em 2003 o rebuliço foi formado com o convite a Yngwie Malmsteen. Gostando ou não do sueco, é fato que colocá-lo ao lado de Satriani e Vai era o sonho de uma maioria.
Por isso mesmo a decisão de lançar algum registro da reunião histórica. O CD duplo Rockin’ in the Free World e o DVD Live in Denver chegam às lojas como trabalhos indispensáveis aos fãs dos três guitarristas e a todos que simplesmente gostam do instrumento. Claro, excetuando os que desprezam virtuosismo por uma questão de “menos é mais” e não querem ao menos saber separar o joio do trigo. A grande vantagem em relação aos lançamentos com Eric Johnson está no repertório, que tem mais músicas e, ainda melhor, diferenças de um formato para outro. Preocupação que apenas Johnson teve há quase sete anos.
Agora, Satriani repetiu apenas Midnight, The Mystical Potato Head Groove Thing e a excelente The Extremist. No DVD, incluiu Starry Night e o clássico Satch Boogie; no CD, duas de suas melhores músicas: Crystal Planet e sempre maravilhosa Always With Me, Always With You ― prova de que o “menos é mais” também vale para quem tem completo domínio do instrumento, afinal, o que vale é saber compor. Acompanhado por Jeff Campitelli (bateria), Matt Bissonette (baixo) e Galen Hanson (tour manager que faz as vezes de guitarrista base), Satriani não muda sua linha de pouco espaço a improvisos, o que é compensado com a facilidade que tem para criar belos temas.
Vai, por sua vez, perdeu o batera Virgil Donati, substituído por Jeremy Colson (ex-Michael Schenker Group), mas Billy Sheehan (baixo) e Tony MacAlpine (guitarra e teclados), além do Dave Weiner (guitarra-base), fazem qualquer time virar “dream team”. De qualquer maneira, só mesmo Vai para começar o show sozinho e tocando uma guitarra de três braços em I Know You’re Here, um dos melhores momentos do DVD que ainda tem Juice e a festa de I’m the Hell Outta Here – no CD ela aparece como You’re Here, uma vez que a introdução foi cortada. Em áudio também encontramos Reaping e a maravilhosa Whispering a Prayer, um daqueles momentos que colocam Vai acima de qualquer outro guitarrista vivo.
E Malmsteen… Bem, ao dar férias ao vocalista Doggie White, ele resgatou seu material instrumental e deu chance a músicas simplesmente geniais, como Evil Eye e Far Beyond the Sun (no DVD), da obra-prima Rising Force (1984), e Trilogy Suite Op. 5 – The First Movement, de Trilogy (1986). A coceira em seus dedos só não consegue estragá-las porque são canções realmente perfeitas, escritas na época de uma inspiração que parece mesmo não querer voltar. Mas o mesmo já não acontece nas mais recentes Baroque and Roll (DVD) e Blitzkrieg (CD), quase se perdendo no exagero de notas em Red House, de Jimi Hendrix, e também em Fugue e Adagio, de Concerto Suíte for Electric Guitar and Orquestra in E Flat Minor Op.1, CD gravado com a Orquestra Filarmônica da República Tcheca e lançado em 1998.
Na jam, então, o espetáculo chega a ser risível. Em Voodoo Child (Slight Return), outra de Hendrix, é compreensível que ele fique à frente dos outros dois guitarristas, afinal, é a música escolhida e cantada por ele. Mas nos momentos solos e em todos os duelos fica latente a necessidade que Malmsteen tem de aparecer mais que todo mundo, e é só assistir ao DVD para perceber a distância que Vai e Satriani tentam manter não por vergonha, mas porque não vale competir.
Satriani manda muito bem em Rockin’ in the Free World, arrasa-quarteirão de Neil Young, e Vai dá um show de feeling em Little Wing, mais uma de Hendrix, o mestre dos mestres. Mesmo com Malmsteen fritando nos solos, chutando o ar e mexendo toda hora nos cabelos. Ah, sim: se você quer saber quem é o baixista que acompanha o sueco, o nome é Mick Cervino. Acontece que ele pulou fora da banda, então Malmsteen não o creditou. Patrick Johansson (bateria) e Jocke Svalberg (teclados) ainda estão com o guitarrista e ganharam espaço no encarte para publicação de seus nomes.
Resenha publicada na edição 102 do International Magazine, em maio de 2004.
Quando o Dr. Sin anunciou, em 2000, que estava virando um quarteto com a entrada do vocalista Michael Vescera (ex-Loudness e Yngwie Malmsteen), a sensação era de que o respeito e a admiração de fãs e imprensa especializada enfim se transformariam num merecido sucesso internacional. No mesmo ano, o excelente Dr. Sin II foi lançado com distribuição em bancas de jornal ― esquema que ainda engatinha no Brasil ― e lojas especializadas, mas o quinto disco do grupo não vingou da maneira que todos gostariam.
Sem Vescera ― que hoje acompanha o guitarrista Joe Stump no Reign of Terror e ainda reformou o Obsession ―, os irmãos Andria (baixo e voz) e Ivan Busic (bateria e vocal) e Eduardo Ardanuy (guitarra) seguiram em frente realizando shows pelo país. Para comemorar dez anos de carreira, o trio realizou dois shows especiais no Sesc Ipiranga, em São Paulo, nos dias 23 e 24 de maio de 2002, e ambos resultaram em 10 Anos ao Vivo, CD duplo e DVD lançados no fim do ano pela Paradoxx Music.
Os quatro anos sem gravar material inédito foram devidamente compensados com um trabalho tecnicamente perfeito. Afinal, Andria, Ivan e Ardanuy não apenas são três dos melhores músicos do Brasil, mas contribuíram de maneira fundamental para o desenvolvimento e crescimento do rock pesado feito em terras tupiniquins. De metade dos anos 80 para cá, fizeram parte de grupos seminais ― Platina, Cherokee e A Chave do Sol ― e emprestaram talento para Wander Taffo, Ultraje a Rigor e Supla, por exemplo.
Assim, 10 Anos ao Vivo é um pedaço da história do metal nacional, um verdadeiro presente para os fãs. Claro, álbuns ao vivo têm o mesmo defeito de coletâneas, ou seja, sempre falta alguma coisa ― particularmente, quatro das músicas favoritas deste que vos escreve ficaram fora: Miracles, Gates of Madness, Hey You e Scream and Shout. No entanto, as 18 canções do set list fazem jus à carreira do trio e cobrem com louvor os quatro trabalhos de estúdio.
Do primeiro CD, Dr. Sin (1993), não poderia faltar Emotional Catastrophe, primeiro grande clássico do trio, mas os destaques são Stone Cold Dead, que ganhou uma dose extra de peso, e The Fire Burns Cold, com trechos de Wild Thing e Voodoo Chile (Slight Return), do mestre Jimi Hendrix, e uma aula de Ardanuy (é impressionante o que esse cara toca!). Indo de um extremo ao outro, Dr. Sin II cede quatro músicas, e todas são um arregaço. Peso, riffs poderosos, refrãos contagiantes e instrumental preciso são encontrados em Time After Time, Fly Away, Eternity e Danger. E se Andria não atinge as notas mais altas de Vescera ― que canta uma barbaridade, diga-se ―, também não faz feio. Justiça seja feita, é um vocalista bem acima da média.
Com mais representatividade, Insinity (1997) tem seis canções no repertório. Sometimes ficou ainda melhor ao vivo; No Rules é anunciada com algumas notas de Lazy, do Deep Purple; e Leaving and Learnig e Zero provam a excelência do Dr. Sin para criar refrãos deliciosos. Ainda assim, impossível não dar maior destaque a Futebol, Mulher & Rock n’ Roll, que já nasceu com o rótulo de clássico, e para a maravilhosa Revolution, uma das melhores músicas da banda ― no show com a participação do percussionista Marcus Cesar e um emocionante coro do público.
Brutal (1995) traz outra surpresa: a belíssima Years Gone cantada também por Ivan e com as participações de Marcus Cesar e de Marcos Sérgio, este tocando xarango. Além disso, Isolated (que solo espetacular!), Karma e Down in the Trenches ficaram perfeitas ― principalmente a última, com Ardanuy mudando o solo, fato raro, e os irmãos Busic brilhando (Ivan com um trabalho de caixa impecável e quebradas e viradas precisas; Andria com uma aula de slaps e two hands). Em Fire, que encerra o show de maneira apoteótica, Andre Matos, vocalista do Shaman, sobe ao palco para uma participação especial e no fim se junta aos fãs para aplaudir o trio. Nada mais justo. Apesar de o DVD possuir extras bem tímidos ― todos os videoclipes poderiam ter sido incluídos ―, 10 Anos ao Vivo nasceu indispensável.
Resenha publicada na edição 102 do International Magazine, em maio de 2004.
Depois de bater um belo papo com o vocalista Corey Glover (confira como foi) e esmiuçar o novo disco do Living Colour, CollideØscope (saiba mais aqui), o International Magazine esteve em duas das cinco apresentações que o grupo fez em abril no Brasil: na segunda noite em São Paulo (17), no Via Funchal, e no show único realizado no Rio de Janeiro (22). Se pudesse, o escriba aqui teria assistido aos outros três shows ― a banda ainda tocou em Curitiba (23) e Porto Alegre (24) ―, e sem a menor possibilidade de arrependimento.
Motivos para tanto não faltam, mas o principal é que cada noite é uma surpresa. Fugindo da previsibilidade, o grupo não apenas altera a ordem do repertório, como apresenta um set list diferente em cada show. Quem foi ao primeiro show em São Paulo se deliciou com Memories Can’t Wait, Go Away, Nothingness, Broken Hearts e Should I Stay or Should I Go (The Clash). Na noite seguinte, mais duas canções novas ― Song Without Sin e a bela Pocket of Tears, arrasadora com um trecho de Sex Machine, de James Brown ― se juntaram a covers de Rolling Stones (a improvisada Time is on My Side), Jimi Hendrix (Crosstown Traffic) e Bad Brains (Sailin’ on). Um show maravilhoso, principalmente para quem esperou quase 11 anos para assistir novamente ao quarteto, mas que perdeu em animação para o do Rio.
Em um Canecão quase lotado, Glover, Vernon Reid (guitarra), Doug Wimbish (baixo) e Will Calhoun (bateria) deram uma aula de música, energia e empatia com o público. Começar com Back in Black, do AC/DC, e emendar com Type foram motivos suficientes para colocar a casa abaixo. Middle Man, Leave it Alone, Memories Can’t Wait e Time’s Up deram sequência à covardia, levando os fãs à loucura e mostrando uma banda afiadíssima – o que não foi nenhuma surpresa – e absolutamente de bem com a vida.
A reclamação de muita gente em relação à dificuldade em achar CollideØscope, apesar de o CD ter sido lançado no Brasil há quase seis meses, não é à toa. In Your Name, a excelente A ? of When, Sacred Ground e Flying foram tocadas de uma só vez, e a grande maioria apenas prestou atenção. Havia quem soubesse as letras do início ao fim ― principalmente de Sacred Ground, uma das quatro inéditas da coletânea Pride (1995), que foi regravada no novo disco ―, mas era a hora de apenas aplaudir. A maravilhosa Flying, por sinal, foi um dos pontos altos, ainda mais com o brilhante improviso de Reid no fim.
Falando em brilhar, a interpretação de Glover no início de Open Letter (To a Landlord) é simplesmente de arrancar lágrimas. Em uma das melhores canções da banda, o vocalista deu uma aula de feeling e improviso, incluindo até mesmo canto gospel, e mostrou que definitivamente está entre os melhores do mundo. Só vendo e ouvindo para crer. Acompanhado apenas de Calhoun, Wimbish teve sua vez em Terrorism, uma crítica aos “bastardos que vêm tornando o mundo um lugar ruim para viver”, e o baixista não deixou de citar o presidente dos EUA, George W. Bush, e o primeiro-ministro da Inglaterra, Tony Blair, além da CIA, do FBI e da rede CNN. Desnecessário dizer que sobraram aplausos.
Reid ainda cantou 7 Nation Army, do chatíssimo White Stripes, e daí para frente o Canecão terminou de se transformar numa verdadeira apoteose. Postman, a primeira surpresa no repertório, abriu caminho para o clássico Cult of Personality, cantada em uníssono pelos fãs. Glamour Boys contou com nove garotas tiradas da platéia para dançar no palco ― a maioria escolhida por Glover ―, e Elvis is Dead só não terminou de incendiar a casa porque ainda havia mais pela frente. Depois de Calhoun mostrar por que é venerado por dez entre dez bateristas, Ignorance is Bliss e um blues improvisado foram o cartão de visitas para outro clássico, a espetacular Love Rears its Ugly Head.
A grande surpresa da noite veio mesmo a seguir, com Funny Vibe, que não foi apresentada em São Paulo e era uma das mais aguardadas pelos fãs. O show terminaria com Crosstown Traffic e sua oportuna menção a What’s Your Favorite Colour?, mas a banda resolveu voltar. Mesmo depois da segunda despedida, com Glover e Wimbish descendo ao “chiqueirinho” para cumprimentar os fãs e tirar fotos com quem pedisse, ainda teve espaço para Should I Stay or Should I Go. Se ainda há alguma dúvida, o motivo foi mesmo a satisfação da banda com a reação do público. Não houve quem ficasse parado na pista, assim como Glover e Wimbish foram um show à parte nas duas horas e 35 minutos de um show inesquecível.
Resenha publicada na edição 102 do International Magazine, em maio de 2004.
Desde que se juntou ao Deep Purple, em 1994, Steve Morse se mostrou mais ativo do que nunca. Além das várias e constantes turnês ao lado de Ian Gillan, Roger Glover, Ian Paice e Jon Lord (de 2003 para cá, Don Airey), o guitarrista gravou três discos de estúdio ― Purpendicular (1996), Abandon (1998) e Bananas (2003) ― quatro duplos ao vivo ― Live at the Olympia ’96 (1997), Total Abandon (1999), In Concert With the London Symphony Orchestra (2000) e Live at the Rotterdam Ahoy (2001) ― e vários DVDs. Com o Dixie Dregs, lançou o ao vivo California Screamin’ (2000) ao mesmo tempo em manteve a Steve Morse Band na ativa com três discos ― Structual Damage (1995), Stressfest (1996) e Split Decision (2002). Como se fosse pouco, Morse resolveu lançar alguns trabalhos como artista realmente solo. Teve o DVD Sects, Dregs & Rock’n’Roll (2003), mas o mais bacana é mesmo o projeto Major Impacts, cujo segundo volume acaba de ser lançado.
Em vez de apenas gravar covers como forma de homenagem a seus músicos e grupos favoritos, o guitarrista resolveu lançar dois álbuns em que o tributo seria em forma de composições próprias, só que todas calcadas no estilo dos ídolos. O primeiro CD, que chegou às lojas em 2000, reverenciou Cream, Jimi Hendrix, Jeff Beck, Eric Johnson, Alex Lifeson (Rush), The Byrds, Jimmy Page (ex-Led Zeppelin), John McLaughlin, Rolling Stones, Mountain, George Harrison (ex-Beatles), Allman Brothers, Kansas e Yes.
Mais uma vez acompanhado do baixista Dave LaRue e do baterista Van Romain ― ambos da Steve Morse Band, diga-se de passagem ―, o guitarrista volta a fazer bonito em Major Impacts 2, um disco totalmente agradável, e mostra o porquê de conquistar prêmio atrás de prêmio nas revistas especializadas. Em Tri County Barn Dance e Ghost of the Bayou, por exemplo, ele dá uma amostra de seu bom gosto em canções tipicamente country. Predominantemente acústica, a primeira é uma homenagem ao Blue Grass, e a segunda, a Cajun.
Morse ainda passeia pelo rock progressivo com a excelente Organically Grown, cujos teclados entregam a referência explícita a Emerson, Lake & Palmer, e Abracadab, seu tributo ao Genesis ― sem os resquícios de música pop do período em que Phil Collins tomou as rédeas da banda. Antes mesmo de chegar ao rock propriamente dito, o guitarrista lembra Johan Sebastian Bach em Air on 6 String, cujo título já entrega: uma canção comandada pela guitarra e nada mais. E não precisava mais do que isso, mesmo…
Fazendo menção a grupos irlandeses como Bothy Band e Chieftains, Morse apresenta sua influência de música celta na belíssima Cool Wind, Green Hills, com dedilhados inspirados. Na semiacústica Wooden Music, as honras vão para Crosby, Stills, Nash & Young, mas é em Where Are You? que os riffs ganham força. Não é necessário esforço algum para identificar The Who logo nos primeiros acordes. Aliás, o legal é mesmo ouvir o CD pela primeira vez sem tentar identificar as músicas pelo encarte, uma vez que a ordem é diferente da que está na contracapa, e as referências a cada uma delas estão em simbologia.
12 Strings on Carnaby St. traz mais uma homenagem a Jeff Beck e Jimmy Page, em nome do Yardbirds, mas desta vez se refere também ao pop britânico de bandas como Hollies e Small Faces (esta pela citação do clássico Itchycoo Park). Leonard’s Best, uma das melhores do álbum, é realmente puro Lynyrd Skynyd, assim como Errol Smith entrega no próprio nome a influência de Aerosmith. Também um dos pontos altos do CD, a faixa ainda lembra trechos de Walk This Way, Love in an Elevator e Sweet Emotion. A ótima Motor City Spirit foi escrita com as idéias fincadas em Ted Nugent, Deep Purple e Spirit. Já a suingada Zig Zags é o tributo de Morse ao ZZ Top. Mais dois exemplos de que vale a pena dar uma bela conferida em Major Impacts 2.
Resenha publicada na edição 102 do International Magazine, em maio de 2004.
O visual era para fazer os olhos doerem. Muitas cores e paninhos pendurados por todos os lados, mas musicalmente o KISS começou sua fase mais comercial com um disco maravilhoso. E o motivo atende por um nome: Mark St. John, o substituto de Vinnie Vincent que infelizmente teve uma passagem meteórica pela banda, uma vez que virou quase uma unanimidade para a imprensa na época – pasmem, porque é isso mesmo. Por mais que Ace Frehley fosse o favorito dos fãs, era praticamente consenso: em Animalize, St. John levou a guitarra do grupo a níveis nunca antes atingidos. Sem dúvida o mais técnico que já passou pelo KISS, o guitarrista impressionou não apenas por seus solos – todos maravilhosos, diga-se –, mas também pelos detalhes.
Claro, ele não participou de nenhuma composição, mas é sensível que as seis cordas tiveram um salto de qualidade em melodias e harmonias, e certamente não foi Paul Stanley quem colocou tudo no papel para St. John botar em prática – apesar de Stanley e Gene Simmons não terem gostado tanto assim do trabalho do então novo membro, o que justifica terem chamado Bruce Kulick para gravar os solos de Lonely is the Hunter e Murder in High-Heels. Mas há também vários méritos para o Starchild, que estava em grande fase e realizou uma de suas melhores performances em disco. Mais do que isso, manteve a banda em pé na ausência de Simmons, que se deixou seduzir pelas indústrias cinematográfica e fonográfica.
De corpo presente em Hollywood muito mais do que no estúdio, Simmons pouco participou de Animalize. Cantou e compôs, obviamente, mas a produção foi feita por Stanley, que ainda contou com a ajuda de Jean Beauvoir (ex-Plasmatics) para gravar o baixo em 1/3 das faixas. I’ve Had Enough (Into the Fire) abre o disco de forma arrebatadora, com Eric Carr e Stanley mandando muito bem numa das melhores canções da segunda fase do grupo. E St. John precisou de apenas seis segundos para começar a mostrar serviço e deixar muita gente de queixo caído.
Heaven’s on Fire é o hit do álbum e, consequentemente, não acompanha as demais, afinal, era a que deveria vender o trabalho. Apesar disso, se dá bem num bom riff e no refrão pegajoso. Falando em riffs, que festa! O KISS sempre foi muito bom nisso, e aqui o negócio é uma beleza. Todos são sensacionais, mas é impossível resistir a Murder in High-Heels. Que coisa linda! E são os riffs que movem as excelentes Burn Bitch Burn, Get All You Can Take, While the City Sleeps e Lonely in the Hunter, todas, à exceção desta última, com um show à parte de St. John.
Ouvir Under the Gun e Thrills in the Night (sensacional, e nesta St. John precisa de apenas um segundo para brilhar) é voltar no tempo e lamentar que o guitarrista tenha tido sua história com o KISS abreviada por causa da Síndrome de Reiter, rara desordem que afeta os nervos da mão e impede os movimentos, apesar de ter sido muito bem substituído por Kulick. Ainda assim, uma pena que ele – que mais tarde montou o White Tiger e não obteve sucesso comercial – tenha sido relegado pelo destino ou até mesmo esquecido na história do metal. Se há duas décadas ele impressionou, hoje seria um bálsamo.
Atualização em 14/09/2019: Mark St. John, cujo verdadeiro nome era Mark Leslie Norton, faleceu em 5 de abril de 2007, aos 51 anos, de hemorragia cerebral. A causa da morte é dada como consequência de um brutal espancamento sofrido enquanto esteve detido na Theo Lacy Jail, no Condado de Orange, Califórnia, em setembro de 2006. A agressão foi orquestrada por um dos guardas da prisão, chamado Kevin Taylor, e teve a participação de mais de 20 detentos. St. John foi preso depois de ser acusado de porte de drogas, o que sempre negou. Segundo a sua namorada na época, ele teria sido incriminado por um traficante que havia denunciado anos antes.
Faixas 1. I’ve Had Enough (Into the Fire) 2. Heaven’s on Fire 3. Burn Bitch Burn 4. Get All You Can Take 5. Lonely is the Hunter 6. Under the Gun 7. Thrills in the Night 8. While the City Sleeps 9. Murder in High-Heels
Banda Paul Stanley – vocal e guitarra Gene Simmons – vocal e baixo Mark St. John – guitarra Eric Carr – bateria
Outros Bruce Kulick – guitarra (solo em Lonely is the Hunter e Murder in High-Heels) Jean Beauvoir – baixo (Get All You Can Take, Thrills in the Night e Under the Gun) Allan Schwartzberg – bateria (overdubs em I’ve Had Enough (Into the Fire))
Lançamento: 14/09/1984 Produção: Paul Stanley Mixagem: Dave Wittman