Inglorious – Ride to Nowhere

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Classic British rock. É assim que Nathan James se refere à sua banda, graças ao resgate da sonoridade inglesa do hard rock dos anos 70 que faz ao lado de Andreas Eriksson e Drew Lowe (guitarras), Colin Parkinson (baixo) e Phil Beaver (bateria) – ou fazia, na verdade, porque apenas o batera continua na formação. Antes mesmo do lançamento de Ride to Nowhere, um choque de egos com James fez com que Eriksson, Lowe e Parkinson pedissem as contas, e o vocalista prontamente os substituiu por Danny Dela Cruz, Dan Stevens e o brasileiro Vinnie Colla, respectivamente. O efeito do entra e sai de músicos só será sentido no próximo álbum, obviamente, mas a verdade é que o Inglorious faz aquele resgate tão bem, mas tão bem que se tornou um dos melhores nomes do hard rock nos anos 2010.

Os dois primeiros álbuns, Inglorious (2016) e Inglorious II (2017), são essenciais para quem curte o estilo, e o terceiro trabalho vai pelo mesmo caminho. Curiosamente, no entanto, mostra um grupo construindo uma identidade bem particular – que será mesmo testada no próximo disco, uma vez que o novo material tem a assinatura de James ao lado dos ex-integrantes, principalmente de Parkinson. De qualquer maneira, canções como Where Are You Now?, Queen e Liar têm estruturas que identificam imediatamente a banda inglesa, muito por causa dos refrãos e das melodias vocais. É um classic rock repaginado por uma banda nova, uma vez que o Inglorious tem apenas cinco anos de vida.


Mas por que repaginado? Bom, ouça a faixa-título. Ride to Nowhere, a música, tem mudanças de clima e passagens instrumentais interessantes, incluindo um discreto e bem encaixado Hammond, cortesia do convidado Troy Draper, responsável por todos os teclados. Porém, ela surpreende por apresentar um peso até então incomum ao quinteto. Freak Show, por sua vez, apresenta parte desses elementos, mesmo que em menor proporção, porque seu destaque é um refrão com um coro para lá de pegajoso. Mas refrão sensacional mesmo tem a ótima While She Sleeps, que ainda presenteia os fãs de guitarra com um baita trabalho de seis cordas. E é interessante notar que Eriksson e Lowe se dividiram entre os dois canais, portanto, vale a pena meter os fones de ouvido.

E com todas essas nuances, o mais legal no CD é encontrar cinco das melhores obras criadas pelo Inglorious. Comece pela ‘bluesy’ Never Alone, que tem um toque de Led Zeppelin, e depois vá direto para as suingadas Tomorrow e Time to Go. A primeira tem um baixo lindão durante o solo e (mais um) refrão grudento, enquanto a segunda arrisca uma melodia vocal funkeada, a deixa perfeita para o groove que rola solto na ponte e no refrão – reparou que os caras são muito bons nisso, né? E se o novo álbum apresenta em nove das suas 11 faixas um classic rock com peso e groove, sobra espaço para a beleza das baladas.


Com participação de Heather Leoni (Gypsy Heart), I Don’t Know You mostra James numa performance muito próxima de Glenn Hughes, especialmente no início da canção, e traz um solo matador de Eriksson – e fica a dica: o dueto ficou ainda melhor na versão piano e voz(es) que entrou como bônus na edição japonesa de Ride to Nowhere, principalmente porque Heather ganhou mais frases da letra. E ainda tem a acústica Glory Days, para mostrar não apenas que James canta uma barbaridade, mas que o inglês é, provavelmente, o melhor vocalista de rock surgido nesta década. Provavelmente só porque falta pouco para os anos 2020 começarem…

Faixas
1. Where Are You Now?
2. Freak Show
3. Never Alone
4. Tomorrow
5. Queen
6. Liar
7. Time to Go
8. I Don’t Know You
9. While She Sleeps
10. Ride to Nowhere
11. Glory Days


Banda
Nathan James – vocal
Andreas Eriksson – guitarra
Drew Lowe – guitarra
Colin Parkinson – baixo
Phil Beaver – bateria

Lançamento: 25/01/2019

Produção: Inglorious
Mixagem: Kevin Shirley

Queensrÿche – The Verdict

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Queensrÿche (2013) foi o resgate do tempo perdido, e Condition Hüman (2015), a consolidação da sonoridade clássica. Mas The Verdict é aquele novo trabalho do Queensrÿche ao qual os fãs se acostumaram nos primeiros dez anos da banda. Ou seja, é previsivelmente imprevisível. O 16º álbum de estúdio do precursor do progressive metal remete à obra-prima Rage for Order (1986), mas em sentidos bem específicos: não é uma continuação dos discos anteriores com Todd La Torre; necessita de várias audições para que o ouvinte se acostume com ele, para que absorva todos os detalhes; e poderia muito bem ser o CD recém-saído do forno de algum nome promissor, exatamente pela maneira como deixa a música da banda revigorada.

La Torre (vocal), Michael Wilton e Parker Lundgren (guitarras) e Eddie Jackson (baixo) até foram relativamente objetivos em certos momentos – em tempo: apesar de Casey Grillo (ex-Kamelot) acompanhar o quarteto nos palcos há quase dois anos, o vocalista gravou todas as baterias e mandou bem demais. Mas é claro que o extraordinário Scott Rockenfield fará falta. Ele sempre foi peça-chave no som do Queensrÿche, mas se decidiu pular fora… Enfim, há canções mais palatáveis, como o primeiro single, Man the Machine, mais tradicional e até com um pouco de Iron Maiden na mudança de andamento no fim, o que ressaltou o baixo de Jackson, um dos destaques do álbum. E há também Propaganda Fashion, que é, apesar de algumas variações, a faixa mais acessível de The Verdict. Como um filho temporão de Empire (1990).


O fato, no entanto, é que a banda usou e abusou das mudanças de andamentos, compassos compostos e convenções pouco usuais. Como na passagem da estrofe para a ponte da excelente Blood of the Levant, que ainda apresenta riffs palhetados e um conteúdo lírico que reforça a posição de ‘thinking man’s band’ – concedida ao Queensrÿche em seus primeiros anos por causa das letras muito acima da média – pela referência à guerra na Síria do ditador Bashar al-Assad. Em Bent, o grupo leva o fã a pensar em assuntos como a devastação dos ameríndios e a tomada de suas terras, além da contaminação de centenas de milhares de pessoas em Flint, no estado de Michigan, devido ao mau tratamento da água. Musicalmente, Bent tem um quê de Nevermore nos versos – especialmente na primeira parte, na qual a interpretação de La Torre remete a Warrel Dane – e instrumental e refrão impecáveis.

As nuances instrumentais ganham nova dimensão na espetacular Launder the Conscience, que vai do peso a um desfecho inusitado na forma de uma peça progressiva puxada pelo piano, com orquestrações e Eddie Jackson mostrando mais uma vez que merece muito mais crédito no mundo do heavy metal. Os arranjos orquestrais, aliás, são outro ponto alto de The Verdict. Sejam os mais tímidos, como os de Inside Out, para não soterrar a melodia indiana que permeia a música, enriquecida por um belíssimo solo em sua parte mais lenta; sejam os mais presentes, como na linda e emocionante Dark Reverie, composição de Lundgren, cujo talento o fez sair do papel de ex-genro de Geoff Tate para o de substituto definitivo de Chris DeGarmo.


Dark Reverie, diga-se, mostra uma veia progressiva que fica ainda mais forte em Portrait, que mantém a tradição de fechar os discos de maneira épica. Lenta e muito, mas muito bonita (que refrão!), tem algo de Promised Land (1994) e uma guitarra slide que pode fazer você jurar que está ouvindo as notas saírem dos dedos de DeGarmo. O trabalho de Wilton e Lundgren nas seis cordas continua resgatando o som característico do Queensrÿche, felizmente, com uma riqueza de detalhes que pode ser exemplificado na pesada Inner Unrest, cujo instrumental caprichadíssimo é acompanhado por uma bela melodia vocal.

As nove canções detalhadas aqui já seriam suficientes para dobrar o último dos reticentes, mas tem Light-years. Meu amigo, que música! O início com o peso do prog metal e os ótimos riffs compõem um instrumental completamente torto e nada a ver com um dos melhores refrãos já feitos pela banda. É o melhor exemplo das quebradas de tempo e compassos compostos que o quarteto espalhou por todo o trabalho, incluindo solos dobrados, uma aula à parte de Jackson (sério, esse cara toca demais) e La Torre fazendo aquele lick com ride e hi-hat característico de Rockenfield. Desde o homônimo álbum de estreia de La Torre, a banda vem fazendo sempre o melhor disco desde Promised Land. Agora, fez a melhor obra deste “novo” Queensrÿche, que vai ficando cada vez relevante novamente.


Faixas
1. Blood of the Levant
2. Man the Machine
3. Light-years
4. Inside Out
5. Propaganda Fashion
6. Dark Reverie
7. Bent
8. Inner Unrest
9. Launder the Conscience
10. Portrait

Banda
Todd La Torre – vocal e bateria
Michael Wilton – guitarra
Parker Lundgren – guitarra
Eddie Jackson – baixo

Lançamento: 01/03/2019

Produção e mixagem: Chris “Zeuss” Harris

Living Louder

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

O revival do rock’n’roll dos anos 70 ganhou força nos últimos anos, e um sem-número de bandas vem fazendo a alegria daqueles que cresceram sob o som do classic rock e, mais do que isso, dando a uma nova geração a oportunidade de descobrir os grandes nomes do passado – e de continuar ouvindo música de alto nível. Mas a nova turma responsável por trazer à tona aquela sonoridade não está concentrada apenas nos Estados Unidos e, principalmente, na Europa. Tem coisa muito boa sendo feita aqui no Brasil, e um dos expoentes desse resgate em território nacional é o Living Louder. Formado em 2016 por Ricardo Cagliari (guitarra e vocal), Eduardo Assef (baixo) e Gustavo Gomes (bateria), o power trio já colocou dois discos na praça: o de estreia, homônimo, em 2017, e o mais recente, Corsair, em 2018 – este, diga-se, é um dos trabalhos lançados ano passado que você tem a obrigação de conferir (clique aqui para ler a resenha). Para falar sobre o novo álbum, a trajetória até aqui e outras coisas mais, conversei com os três músicos, então abra a cerveja, coloque o som para rolar (os CDs estão disponíveis nas plataformas de streaming) e curta o papo!

O Living Louder é uma banda ainda bem jovem, que vai completar o terceiro ano de vida em maio deste ano, então podemos começar falando sobre o que uniu vocês três para montar a banda. E como foi…
Ricardo Caglieri: Acabamos nos unindo por intermédio do Franco Mattos, um amigo em comum, também músico, com quem cada um de nós conviveu em diferentes épocas de nossas vidas. A afinidade foi instantânea, tanto pessoal quanto musical. Resolvemos nos reunir e fazer uns sons para sentir como seria a química, então vimos que não poderia ser melhor. Imediatamente passamos a compor o material que, alguns meses depois, viria a fazer parte do nosso primeiro disco.
Gustavo Gomes: Foi tudo, de fato, muito espontâneo e empolgante, e é esse entusiasmo genuíno que buscamos transmitir ao ouvinte. É importante dizer que, embora a banda seja nova, somos todos músicos experientes, cada um com pelo menos três décadas na música, então são muitas influências depuradas e plasmadas neste som original, que vem sendo muito bem recebido mundo afora.
Eduardo Assef: É tudo realmente recente, e os resultados são muito positivos, felizmente, impulsionados pelo objetivo comum de fazer algo muito próximo daquilo que crescemos ouvindo.

E tem o nome da banda. Em inglês e mesmo traduzido para o português, ele tem um sentimento bem rock’n’roll, afinal, é assim que se deve viver e ouvir a música. Mas qual o significado para vocês?
Ricardo: Exatamente o que você mencionou! O recado da banda é esse: ‘play it loud!’ Toque no talo, escute no talo e viva no talo! O morno nos faz vomitar.
Gustavo: Batizar é a parte mais difícil de formar uma banda, não? (risos). Mas você captou perfeitamente a ideia, pois queríamos um nome forte e sonoro, que passasse a sensação de rock’n’roll tocado alto e vivido 24 horas por dia. Afinal, para que procurar definir um estilo em termos de gênero e subgênero se no fundo, como bem resumia o saudoso Lemmy, ‘we play rock’n’roll’?
Eduardo: E é tocar como se cada ‘gig’ fosse a última, fazer um rock’n’roll sincero, sem pasteurização ou artifícios tecnológicos. Tudo no melhor estilo ‘plug & play’.


Há outra coisa que acredito tenha sido bem pensada logo na fase embrionária, o fato de o Living Louder ser um power trio. É isso mesmo?
Ricardo: Aí há três questões envolvidas. Primeiramente, a conexão entre nós três foi tão rápida e produtiva que nem sentimos necessidade de mais um integrante. Segundo, é melhor em termos pragmáticos, mais simples de administrar ideias e obter resoluções a respeito de todas as questões artísticas e empresariais. E isso, no nosso caso, acontece sempre em consenso. Por fim, temos um especial carinho por power trios, como Cream, Motörhead e Gov’t Mule do inicio da carreira.
Gustavo: Foi realmente um misto de coincidência com gosto pessoal, pois nos reunimos fortuitamente, e com a capacidade do Ricardo de também cantar, além de tocar guitarra, a banda estava completa. Isso foi ao encontro do nosso gosto por formações compactas e poderosas, a exemplo de ídolos como Jimi Hendrix, Cream, Rush e tantos outros dos anos 60 e 70, nas quais há espaço para o músico desenvolver sua expressividade e buscar preencher as lacunas. O trabalho é dobrado e desafiador, mas o resultado compensa.
Eduardo: Como bem apontado pelo Ricardo, a coisa fluiu tão bem que não sentimos necessidade de incorporar mais integrantes à banda. Além disso, como mencionado pelo Gustavo, esse formato nos remete a grandes ídolos como Cream e Rush.

A sonoridade do Living Louder é calcada naquele heavy rock clássico, mas o mais interessante é que se trata de uma união de diferentes influências pessoais, certo?
Ricardo: Sem dúvida. Há tantas influências que eu nem conseguiria elencar. Eu e Gustavo sempre fomos, desde garotos, mais ligados ao metal, mas também apreciamos bastante diversos outros gêneros musicais. O Edu já é um cara que tem toda a sua formação diretamente calcada no soul, no jazz e no blues, embora também curta rock. Os artistas que nos informam e nos inspiram, dentro de cada um desses gêneros, são inúmeros.
Gustavo: Temos backgrounds distintos, mas todos estudamos música e somos bastante ecléticos, ouvindo desde música clássica até jazz e muito blues. No entanto, acabou sendo no terreno das bandas clássicas dos anos 70, como Allman Brothers Band, Lynyrd Skynyrd, Black Sabbath, Deep Purple, Motörhead et cetera, que se deu a liga de nossas composições. E de maneira bem espontânea, unindo o southern rock americano ao heavy rock britânico. Foi, portanto, com grata surpresa que algum tempo depois notamos que se tornou uma verdadeira onda mundial o revival desse estilo visceral e cru, mas energético e extremamente bem tocado, daquela década, como comprovam bandas como Blues Pills, Vintage Caravan, Graveyard, Lucifer, Kadavar, Willow Child e muitas outras. É um estilo “orgânico”, como dizem hoje em dia.
Eduardo: Exatamente. Penso que esse seja um dos nossos principais ingredientes e um grande diferencial. Cada um de nós tem as suas bandas de cabeceira, mas há um ponto de convergência bastante claro, que é a paixão pela sonoridade dos anos 70 das grandes bandas de heavy rock. Talvez por esse motivo tenhamos optado pelo formato trio que você mencionou na pergunta anterior.


Eu fico imaginando o quão interessante deve ser para vocês três se juntar para compor. Como cada um absorve a influência do outro? Até mesmo em termos de aprendizado, de expandir os horizontes musicais…
Ricardo: Influenciamo-nos mutuamente muito mais do que se possa imaginar. Moramos em cidades diferentes, porque Edu e Gustavo estão em São Paulo, e eu, em Londrina, mas nos falamos diariamente, varias vezes ao dia, e na maior parte das vezes nem é diretamente sobre o Living Louder. Trocamos ideias sobre bandas, músicas, literatura e artes em geral. Um sempre aponta para o outro alguma obra, musical ou não, que acha muito bacana e que merece ser apreciada com carinho. E sempre somos muito francos sobre como gostaríamos de moldar nosso som. Nessa dinâmica, invariavelmente os gostos de cada um acabam influenciando os demais, e isso se reflete imediatamente no processo de composição, no qual as preferências pessoais de cada um são respeitadas e levadas em conta, sendo ajustadas à natureza do som que queremos tocar, obviamente.
Gustavo: Toda a experiência de criação é extremamente prazerosa para nós, é o que mais nos motiva. Mas, por incrível que pareça, nosso processo de composição se dá a distância, porque moramos em cidades diferentes e, sobretudo em razão de nossos diversos compromissos, é difícil nos encontrarmos pessoalmente com grande frequência. A tecnologia, definitivamente, é uma grande aliada, com a troca de arquivos que resultam, sempre com grande rapidez, em novas músicas. Mas é importante frisar que nunca deixamos a facilidade da tecnologia matar a vitalidade e a espontaneidade das nossas criações. O mais importante é que a música tem de ser cativante, boa para colocar alto no som do carro e conduzir o ouvinte a territórios antes inexplorados.

Vamos falar um pouco de Corsair, e gostaria de começar pela ótima produção. É um dos pontos mais fortes da evolução da banda, principalmente levando em consideração que o novo álbum saiu um ano depois do trabalho de estreia.
Ricardo: De fato, foi algo completamente diferente do que tivemos no primeiro disco. Gostamos da produção de Living Louder, e o Thiago Bianchi, responsável pelo trabalho, dispensa qualquer tipo de apresentação. Mas tínhamos muito bem definido em nossas cabeças como deveria soar um álbum do Living Louder, e esse foi um ponto importantíssimo. Saber onde se quer chegar é fundamental. Sabíamos que o que queríamos seria muito difícil de obter com alguém fora da banda nos produzindo, seja em razão dos custos altíssimos envolvidos, seja porque provavelmente não conseguiríamos nos fazer entender quanto ao que tínhamos em mente. Decidimos, então, encarar a épica tarefa por nós mesmos. Gustavo, que é um grande curioso e estudioso de engenharia de som, ficou naturalmente encarregado do assunto. Era seu primeiro trabalho nessa condição, e isso sem dúvida gerou muita pressão nele. Por outro lado, usufruímos de uma liberdade sem igual para podermos refazer as coisas quantas vezes fossem necessárias até que tudo ficasse do nosso gosto. Gastamos o fim de 2017 e quase 2018 inteiro envolvidos nesse processo, mas o resultado final não poderia ter sido mais satisfatório para nós. Gustavo fez um trabalho fantástico dando ao álbum uma sonoridade extremamente fiel à que levamos ao vivo.
Gustavo: Fico particularmente feliz com essas generosas palavras, porque, de fato, tomei as rédeas da produção em Corsair, pois sabíamos exatamente o que queríamos, tanto em termos de clima, composição e sonoridade como até de visual. O Ricardo assina também os desenhos do encarte, e eu, o design gráfico, valendo destacar que a arte da capa foi elaborada a partir de trecho de uma magnífica pintura a óleo do artista Ricardo Colombera. Tudo deveria se encaixar e transmitir, com unidade, a sonoridade crua, vintage e, ao mesmo tempo, as composições mais refinadas da banda nesta fase. Elas são repletas de dobros, slides, coros, solos, efeitos e arranjos bastante pensados, fruto de muita pesquisa sonora por parte do Ricardo e do Edu. Pela excelente repercussão, acho que conseguimos. Estamos muito felizes com o resultado.
Eduardo: Como já tivemos oportunidade de expressar em alguns veículos, não poderíamos estar mais satisfeitos com o resultado da produção de Corsair. Gustavo fez um trabalho primoroso tanto com as baquetas quanto como encarregando da produção do álbum. Essa experiência de ter a produção do disco capitaneada por um dos membros da banda foi determinante para alcançarmos o resultado que tínhamos em nossas cabeças.


Aliás, permitam-me dizer: aquela sonoridade orgânica ficaria ainda melhor vinil, caso exista a chance de trabalhar no formato analógico. Até a capa seria enriquecida no tamanho do LP. Estou soando com um velho aqui, apesar de não ser tanto assim, mas há planos para isso?
Ricardo: Sem dúvida nenhuma! E para ser bem sincero, toda a concepção artística do álbum, musical e gráfica, foi feita pensando no formato vinil.
Gustavo: Você tem toda razão! E pensamos mesmo em tudo como se estivéssemos literalmente gravando um disco nos anos 70, destinado ao vinil. É por ora um sonho, mas temos planos nesse sentido. Pena que hoje em dia se consome música majoritariamente no formato digital, péssimo em qualidade sonora e visual, e até mesmo o CD está sofrendo. Imagine, então, viabilizar uma tiragem mínima de algumas centenas de vinis, com custo unitário muitas vezes elevado para o consumidor final, que talvez nem tenha o toca-discos em casa. Mas o vinil está voltando e ganhando tração, assim como o som dos anos 70, e temos inclusive recebido muito incentivo dos fãs para lançar o disco nesse formato, então estamos estudando neste momento a possibilidade de lançar o Corsair também em vinil num futuro próximo.
Eduardo: E não há nada de velho nessa sua observação. Essa sempre foi a nossa vontade, mas os custos para lançarmos em vinil são um tanto elevados. Talvez esse sonho se concretize mais adiante.

E não foi apenas a produção uma agradável novidade. O básico do bom e velho rock’n’roll continua presente, como os riffs de guitarra bem construídos, por exemplo, mas as músicas ganharam muito groove, o que ressaltou o trabalho de baixo e bateria. Como foi essa virada de chave de um disco para o outro?
Ricardo: Nosso primeiro disco foi composto e gravado com extrema rapidez, porque sentíamos a necessidade de nos inserirmos no circuito o quanto antes. Embora gostemos muito das primeiras composições, estávamos cientes de que poderíamos avançar ainda mais em termos de arranjo. Quando se iniciou o processo de composição das novas músicas, pudemos nos debruçar com mais calma sobre cada uma delas de modo a dar-lhes a exata feição que queríamos. Acrescentamos groove, melodia e agressividade necessários para que sentíssemos vontade de ouvi-las muitas e muitas vezes depois de prontas. E nosso objetivo, de fato, é fazer com que a cada audição você bata o pé acompanhando o ritmo de cada compasso, que faça cara de quem acabou de dar o primeiro gole de uísque depois de um dia de trabalho duro.
Gustavo: Como temos dito no release do Corsair, ele representa a banda com muito mais “groove e fúria”. Trata-se de um amadurecimento natural da banda e da forma de compor dos integrantes, algo bem espontâneo, mas muito consciente. Desta vez, a produção permitiu salientar mais o baixo, por exemplo, um destaque não muito comum em bandas de rock, principalmente as mainstream. A qualidade das linhas de baixo do Edu e os timbres refinados que ele extrai do instrumento, isso tudo associado a uma divisão bastante incomum e um suingue próprio que sempre procuro incorporar nas minhas partes de bateria, sobretudo neste álbum, se mostraram realmente um ponto de inflexão em relação ao primeiro disco. Isso compôs um todo bem harmonioso com as guitarras sempre fortes e sofisticadas do Ricardo, assim como os vocais, muito mais encorpados e harmonizados agora.
Eduardo: É outro ganho da produção do Gustavo. Neste álbum, talvez tivemos a oportunidade de expressar ainda mais as nossas inclinações como músicos. As composições de Corsair abriram mais espaço para um trabalho de baixo e bateria com muito mais groove e liberdade, algo que sempre deixa o pessoal da cozinha muito feliz.

Particularmente, esse groove realmente me pegou, porque é algo muito presente numa das minhas bandas favoritas, o Grand Funk. Vocês chegaram a buscar alguma inspiração específica para canções como An Ace Up My Sleeve, Raw Meat e Shoot to Kill Me?
Ricardo: Grand Funk é mais uma de nossas influências. Mas eu diria que, para An Ace Up My Sleeve e Raw Meat, a inspiração mais direta veio de Gov’t Mule e Allman Brothers. Shoot to Kill Me acaba sendo um apanhado de influências da New Wave of British Heavy Metal e também do Motörhead, bastante evidente nas partes mais rápidas.

Gustavo Gomes, Eduardo Assef e Ricardo Cagliari


A propósito, An Ace Up My Sleeve e Raw Meat nasceram para ser tocadas ao vivo, porque têm espaço ideal para jams em cima do palco. A primeira com uma extensão do duelo entre guitarra e baixo, e fico imaginando a segunda com um solo mais longo enquanto a cozinha enlouquece e sai aprontando…
Ricardo: Exatamente! Nao é à toa que a grande inspiração para elas foram os primeiros trabalhos do Gov’t Mule, uma das melhores ‘jam bands’ do planeta. Mais uma vez você captou com precisão o espírito de nossa música!
Eduardo: Sugestão anotada para extensão do duelo entre guitarra e baixo ao vivo! Diversão garantida.

Apesar de o ouvido às vezes pregar peças, eu tenho mania de ficar buscando referências nas músicas, e não pejorativamente. Assim, gostaria de colocar algumas que estão na resenha do CD para vocês comentarem e, se for o caso, cornetarem mesmo. A começar por Corsair, que tem algo de Led Zeppelin.
Ricardo: Led Zeppelin, Tower of Power e até Rage Against the Machine! Essa música ganhou um groove e uma linha de riffs bem marcantes para que ficasse agressiva e surpreendente na medida certa. Feita para ferver o sangue, é a trilha sonora perfeita da própria letra.
Gustavo: Para mim, em termos rítmicos, o início de Corsair soa como algo cajun vindo direto dos pântanos da Louisiana. Temos o comecinho suingado à la The Meters, que vai encorpando e deixando a música pesada até culminar, mais para o fim, num um groove de dois bumbos de inspiração meio math metal de bandas como Meshuggah. Tudo adaptado, claro, ao contexto mais grooveado e rock’n’roll que a música pedia.

Em seguida, cito Deliver Us from Evil, por causa do Black Sabbath.
Ricardo: A música fala de alguém que vive em crime de sangue, mas sem abrir mão da fachada de bom moço. A aura sabática vem principalmente na segunda metade e, sem dúvida, foi a grande referência para que pudéssemos pintar todo o drama da letra com as cores mais berrantes possíveis.
Gustavo: Esta é uma das minhas preferidas. De fato, e você sacou bem!, o começo meio arrastado e o fim mais cavalgado e pesado evocam muito a sonoridade do Black Sabbath, que, aliás, é minha banda preferida de todos os tempos.

A penúltima é My Private Wallontown, porque ou eu imaginei coisas ou ela tem um pouco de Na Na Hey Hey Kiss Him Goodbye, do Steam, e Layla, do Derek and the Dominos, logo no início.
Ricardo: Eric Clapton é, sem dúvida, uma de minhas maiores influências, especialmente na época do Cream. De minha parte, acho que essa música tem um ar meio anos 90, me lembra de algo do Alice in Chains. Realmente não foi intencional, simplesmente acabou soando assim ao término da gravação, ao menos para meus ouvidos. Provavelmente em razão da afinação bem baixa e do refrão.


Para terminar, Running Errands With Mr. D, uma das minhas favoritas. Na verdade, a minha canção favorita do Living Louder, porque o instrumental, o groove, as melodias vocais, especialmente a final… O casamento musical é perfeito, e talvez eu tenha dado mais corda à imaginação ao ouvir algo de Primus e Metallica.
Ricardo: Também é a minha favorita. Outro apanhado de influências, incluindo essas que você citou, e neste caso eu incluo o Helmet, uma de minhas bandas favoritas. Page Hamilton explora acordes que sempre me soaram muito expressivos. Essa música começou a ser desenhada antes do nosso primeiro disco. Edu apareceu com uma letra fantástica e com esse título misterioso, sugerindo que pensássemos em algo mais declamado do que cantado. Foi um desafio criar algo exótico o suficiente para casar com esses conceitos, mas no fim acho que conseguimos. Há até uma pitada meio thrash no fim, para dar o necessário toque de ecletismo e brutalidade que o som pedia.
Gustavo: Que bom que você a curtiu tanto quanto nós! Essa também é uma das prediletas da banda, e nem sempre o ouvinte tem todas essas referências, então pode estranhar num primeiro momento, pois ela realmente bebe em todas as influências da banda, compondo um arco musical que vai desde o classic rock, o funk, o prog, o hard e o heavy até o thrash metal no fim. Então, sim, você captou muito bem as referências, e as bandas que você citou definitivamente estão dentro do contexto.

Com pouco mais de dois anos de estrada, o Living Louder já lançou dois discos. Ambos independentes, mas num esquema bastante profissional que também vai das redes sociais a videoclipes bem produzidos. A internet proporciona essa facilidade, mas quais as vantagens e desvantagens de controlar tudo isso vocês mesmos?
Ricardo: A vantagem, sem dúvida, é ter o controle absoluto do processo criativo e do produto final sem qualquer tipo de influencia externa, facilitando ao máximo nossa satisfação plena. A desvantagem, obviamente, fica por conta da necessidade de você ser obrigado a carregar o piano sozinho, e isso, num pais onde a cultura é precária, pode ser um fardo por vezes insuportável. Mas, como você bem frisou, a banda ainda é nova, então quem sabe o que o futuro nos reserva?
Gustavo: A grande vantagem é mesmo a liberdade criativa e a possibilidade de entregar, ao público final, algo que esteja o mais próximo possível do objetivo expressivo do artista, coisa que antes era uma quimera, quando as gravadoras controlavam todo o processo produtivo de um disco e de sua divulgação. Por outro lado, isso é extremamente cansativo e oneroso, correndo pela banda todos os esforços e despesas. Por essa razão, não descartamos no futuro, se a liberdade for mantida e a proposta for interessante, lançar discos por meio de um selo, sobretudo para expandir a distribuição física de nosso material. Porque a digital já é de âmbito mundial.
Eduardo: É um esquema muito mais trabalhoso, sem dúvida. Pensando no lado das vantagens, certamente a maior delas é a liberdade artística que possuímos, o que nos deixa cada vez mais autocríticos.

O site do grupo, por exemplo, é preciso nas informações para quem quer conhecer o trabalho, e há também uma louvável preocupação com o mercado internacional, com um público em potencial que pode descobrir o Living Louder. Quais os resultados até o momento?
Gustavo: Muito obrigado pela sua avaliação. De fato, nos preocupamos muito com a comunicação da banda e em atender os fãs com informações precisas, atuais e, sobretudo, bacanas. O mesmo se dá com o material gráfico e audiovisual. O resultado desse esforço já é bastante visível, tanto em termos da divulgação da banda na mídia impressa e virtual quanto na extensiva veiculação de nossas músicas e videoclipes em rádios, webradios, blogs, sites e canais de rock e metal de todo o mundo, como por exemplo dos EUA, Alemanha, Portugal e Inglaterra.
Eduardo: Há muita preocupação com o mercado internacional, pois há países em que o rock ainda tem bom espaço. Nossas músicas chegaram a ser tocadas em rádios na Alemanha e nos EUA, e temos recebido bastante contato de fãs de países como Polônia, França e Espanha. Isso nos deixa extremamente satisfeitos!

Eduardo Assef, Gustavo Gomes e Ricardo Cagliari


Dito tudo isso, é muito claro que há talento e potencial de sobra. Então, o que falta para o Living Louder romper a barreira especializada no Brasil? Porque sabemos como isso é difícil num país onde existe uma aversão explícita, de grande público e grande mídia, a artistas direta ou indiretamente ligados ao som mais pesado…
Ricardo: Muito obrigado! Penso que ainda falta o despertar da curiosidade das pessoas. Não há duvida de que, para isso acontecer, sua música deve ser absolutamente surpreendente, e sua imagem e marca devem se tornar mais conhecidas possíveis. Realizar esses dois feitos, todavia, acaba sendo tarefa para poucos, em especial por conta das adversidades que você citou, mas sou convicto de que temos os elementos certos para isso, bastando-nos muito trabalho e paciência.
Gustavo: Nós todos, que batalhamos pela música de qualidade, sofremos com a banalização da vulgaridade neste país, de norte a sul, de leste a oeste. É preciso ter repertório, bagagem intelectual para compreender um som que não é aquele que toca no Faustão, não aparece na Veja e tampouco toca em micareta ou baile funk. Mas a boa música, principalmente no que tange ao rock e ao metal, sempre foi em alguma medida underground. Mesmo o jazz sempre foi de nicho e sempre sobreviveu de alguma forma, principalmente com o apoio fundamental de jornalistas e curadores experientes, como você no Resenhando e de veículos perseverantes como a Roadie Crew. Como já ouvi de um grande produtor, ganhador de Grammy, o rock vai voltar com tudo, e já estão as camisetas do Slayer nos peitos das Kardashians aí para provar! (risos) Por mais bizarro que seja, isso mostra a força icônica que a música pesada carrega, com todo o seu impacto cultural. “Prestigiem as bandas, vá aos shows!” é o mantra que falta ser entoado com mais vigor.

Para terminar, duas perguntas em uma: a viagem mal começou, mas como tem sido até agora? E quais os próximos passos do Living Louder?
Gustavo: ‘What a ride’! Não há nada melhor do que compor músicas poderosas, nas quais acreditamos, e ser reconhecido por isso. Tudo tem sido ótimo, e o melhor está por vir! Estamos na fase de divulgação do Corsair, com shows em diversas cidades, mas em muito breve já voltaremos a compor, pois o estoque de riffs já está explodindo a gaveta! (risos)
Eduardo: O famoso ‘so far so good’ se aplica em nossa trajetória. Ainda temos muito chão pela frente e muita lenha para queimar.

Obrigado pela entrevista, e o espaço final é todo de vocês.
Ricardo: Nós agradecemos muito esse imenso apoio! Estamos em todas as plataformas digitais, portanto, ouçam-nos urgentemente! E também comprem nossos CDs! Estão à venda na Die Hard, então é só entrar no site e buscar! Por fim, acompanhem-nos nas redes sociais e fiquem ligados em nossa agenda de shows. Vocês não vão se arrepender de conferir a energia da banda ao vivo!
Gustavo: Muitíssimo obrigado a você! Suas análises detalhadas e considerações certeiras sobre a nossa banda e todas as demais, sempre excelentes, que recheiam o Resenhando têm sido um bálsamo para nós como músicos e consumidores de boa música. Parabéns. Sentimo-nos muito honrados. E muito obrigado também aos leitores e ouvintes, porque sem eles não somos nada. Entrem na nossa página no Facebook para saber mais e curtir um material sonoro e visual bacana. Grande abraço e até breve!
Eduardo: Muito obrigado, Daniel! Além das excelentes perguntas, nos deixa muito feliz o fato de você ter sacado muito bem a essência do nosso som! ‘The road goes on forever’!

Avantasia – Moonglow

Por Daniel Dutra | Fotos: Alex Kuehr/Divulgação

“É meio modinha começar com uma grande fanfarra, tipo ‘Senhoras e senhores, aqui estamos nós! A maior banda do planeta blá-blá-blá’ (risos). Ghost in the Moon é uma ótima maneira de dar partida no álbum, porque faz o ouvinte mergulhar no conceito”, disse Tobias Sammet durante a entrevista que fiz com o vocalista para a edição de fevereiro da Roadie Crew. Não dá para acusar o mentor do Avantasia de ter feito fama e deitado na cama, e Moonglow foi feito especialmente com aversão ao lugar-comum. A canção que abre o CD é um dos dois maiores exemplos.

Literalmente. Com quase dez minutos, Ghost in the Moon é bela no piano e voz do início, é grandiosa nas orquestrações e é bombástica no refrão que tem vocais de apoio especiais. “Contratamos um coral gospel que costuma cantar em adaptações musicais da Broadway na Alemanha. É um grupo formado por americanos, africanos e holandeses, todos com vozes grandiosas. Quando eles começaram a cantar, o teto do estúdio tremeu!”, contou Sammet, coberto de razão.


E tem The Raven Child, com Jørn Lande e o estreante Hansi Kürsch. A primeira amostra do oitavo álbum de estúdio do Avantasia tem elementos de música celta e muitas variações distribuídos em seus épicos 11 minutos, mas há muito mais em Moonglow. E até melhor. Como Requiem for a Dream, que traz Michael Kiske e escancara um groove de baixo que não aparece toda hora no power metal, além de um corinho pronto para o público cantar junto. Assim como o “Uô ô! Uô ô ô!” viciante de The Piper at the Gates of Dawn, que reúne cinco dos vocalistas convidados: Ronnie Atkins, Lande, Eric Martin, Bob Catley e Geoff Tate – o instrumental ficou a cargo de Sascha Paeth (guitarra e baixo, este dividido com Sammet), Michael Rodenberg (teclados) e Felix Bohnke (bateria).

Em relação ao ex-vocalista do Queensrÿche, vale a pena falar de novo o que está no bate-papo com Sammet: Invincible tem a sua melhor performance em mais de 15 anos – mais precisamente, desde Tribe (2003) –, numa interpretação recheada de técnica e emoção numa canção que remete, em alguns momentos, a Someone Else?, além de ser uma belíssima entrada para Alchemy, que mistura metal tradicional e pop até um refrão 100% metal melódico. As misturas, aliás, dão um charme ao disco. Pegue Lavender, com Catley, por exemplo: é um ótimo encontro do hard rock com o power metal.


Mas não é tudo que empolga. Starlight, com a voz de Atkins, é tão comum que você não vai incluí-la numa playlist do Avantasia. A faixa-título, por sua vez, é bonita e mostra um lado mais palatável ao grande público, mas vale mesmo por mais uma estreia: Candice Night. Agora, duas músicas valem o repeat incessante: com Martin, o cover de Maniac, aquela mesma da trilha sonora de “Flashdance”, ficou sensacional; e Book of Shallows… Meu amigo, a parte pesadona com Mille Petrozza, o terceiro e último debutante da vez, é uma obra de arte. Que riff! E o líder do Kreator ainda conseguiu ofuscar Kürsch, Atkins e até mesmo Lande

Faixas
1. Ghost in the Moon
2. Book of Shallows
3. Moonglow
4. The Raven Child
5. Starlight
6. Invincible
7. Alchemy
8. The Piper at the Gates of Dawn
9. Lavender
10. Requiem for a Dream
11. Maniac
12. Heart (faixa bônus)


Banda
Tobias Sammet – vocal, baixo e teclados
Sascha Paeth – guitarra e baixo
Michael Rodenberg – teclados e orquestração
Felix Bohnke – bateria

Vocalistas convidados
Bob Catley (Magnum) – faixas 8 e 9
Candice Night (Blackmore’s Night) – faixa 3
Eric Martin (Mr. Big) – faixas 8 e 11
Geoff Tate – faixas 6, 7 e 8
Hansi Kürsch (Blind Guardian) – faixas 2 e 4
Jørn Lande (Jorn) – faixas 2, 4 e 8
Michael Kiske (Helloween) – faixa 10
Mille Petrozza (Kreator) – faixas 2
Ronnie Atkins (Pretty Maids) – faixas 2, 5 e 8

Lançamento: 15/02/2019

Produção: Sascha Paeth e Tobias Sammet

2018 in review

Depois de agrupar os cinco discos nacionais favoritos da casa em 2018 (veja e leia aqui), é hora de os 20 álbuns internacionais ganharam o seu espaço conjunto, com links para as respectivas resenhas e um videoclipe para cada um dos dez primeiros. Um total de 25 CDs que dão um panorama mais abrangente da minha lista de melhores de ano publicada na edição de janeiro da Roadie Crew – não à toa, e por motivos óbvios, os dez discos marcados como obrigatórios formam o Top 10 que enviei para a revista, mas o método de avaliação, a partir desta eleição um padrão do Resenhando, está explicado mais lá embaixo. Sem mais delongas…

#10 The Sea Within (THE SEA WITHIN) – Com integrantes do The Flower Kings, Pain of Salvation e The Aristocrats, o supergrupo foi responsável por um grande disco de rock progressivo. Ou “a new art rock collective”, como se autodenomina a banda (clique aqui para ler a resenha completa).


#9 Original Human Music (ULTRAPHONIX) – O que esperar da união musical entre o vocalista Corey Glover e o guitarrista George Lynch? Um álbum que presta homenagem a Living Colour e Dokken, mas com molho engrossado por vários outros sabores (clique aqui para ler a resenha completa).


#8 Set the World on Fire (GIOELI – CASTRONOVO) – Depois de 25 anos, Johnny Gioeli e Deen Castronovo relembram a época de Hardline com um disco sob medida para quem curte ótimos vocais e aquele hard rock melódico com toques de AOR (clique aqui para ler a resenha completa).


#7 The Shadow Theory (KAMELOT) – Terceiro disco com Tommy Karevik, e o melhor desta já não mais tão nova fase da banda americana. Mais uma vez, um sopro de vida inteligente no metal sinfônico, incluindo o conceito lírico para mentes nada preguiçosas (clique aqui para ler a resenha completa).


#6 Damned if You Do (METAL CHURCH) – Tem algo da era David Wayne; tem bastante da versão Mike Howe, o vocalista definitivo do Metal Church; e tem muito de anos 80, incluindo a produção completamente orgânica. E é mais uma aula de heavy metal (clique aqui para ler a resenha completa).


#5 Burn it Down (THE DEAD DAISIES) – Banda veterana é que faz música boa. Aqui, músicos tarimbados e incrivelmente talentosos que se juntaram para mostrar como se faz rock’n’roll e heavy rock clássico de verdade. E os Daisies acertaram novamente (clique aqui para ler a resenha completa).


#4 The Ghost War Diaries (ELECTRIC BOYS) – O grupo sueco já havia lançado uma joia em 2014, e o terceiro disco desde a volta em 2009 confirma as novas expectativas. De novo, a fusão perfeita do vigor do hard rock com o groove do funk (clique aqui para ler a resenha completa).


#3 Patina (RED DRAGON CARTEL) – Se o primeiro disco valeu pela volta de Jake E. Lee à ativa, depois de 20 anos longe dos holofotes, o segundo é um presente para os fãs que ansiavam pelo retorno do genial guitarrista ao estilo que o consagrou (clique aqui para ler a resenha completa).


#2 For the Love of Metal (DEE SNIDER) – Os fãs reclamaram de We Are the Ones, um desvio no caminho do vocalista. Mas se os fãs queriam heavy metal, então ganharam o melhor disco do estilo em 2018. E Dee Snider só precisou abrir a boca e cantar (clique aqui para ler a resenha completa).


#1 Sometimes the World Ain’t Enough (THE NIGHT FLIGHT ORCHESTRA) – Com discos em 2017 e 2018, a banda deve segurar a onda em 2019. Melhor para a concorrência. O NFO poderia virar hors-concours ao ficar em 1º pelo terceiro ano consecutivo (clique aqui para ler a resenha completa).


Segundo tempo (clique no nome do disco para ler a resenha)

#11 Family Tree (BLACK STONE CHERRY)
#12 Prequelle (GHOST)
#13 Thunderbolt (SAXON)
#14 Steelfactory (U.D.O.)
#15 Firepower (JUDAS PRIEST)
#16 Volume II – Power Drunk Majesty (METAL ALLEGIANCE)
#17 Resurrection (MICHAEL SCHENKER FEST)
#18 The Age of Absurdity (PHIL CAMPBELL AND THE BASTARD SONS)
#19 Grimmest Hits (BLACK LABEL SOCIETY)
#20 II (LEATHER)

MÉTODO DE AVALIAÇÃO

Quebre, Passe longe, Vale a audição, Divirta-se, Pode comprar e Obrigatório. O que isso quer dizer para quem lê as resenhas publicadas visando à retrospectiva 2018 (e todas as outras a partir de agora)? Que o leitor deve decidir por ele mesmo se o CD deve passar batido ou ir direto para a sua coleção. Por quê? Porque a resenha traduz a opinião de quem escreve. Goste ou não o fã, resenha de disco sempre foi, continua sendo e sempre será a opinião do autor. No entanto, como dar nota é algo que nunca foi do agrado da casa, a saída foi arrumar alguns quesitos. Com um toque de diversão.

Quebre é apenas figura de linguagem, obviamente, e Obrigatório não significa necessariamente que o álbum é nota 10. Levando-se em consideração os dois extremos da avaliação, são apenas dicas de que ou o trabalho serve apenas para pegar poeira na estante, no caso de você fazer questão de ter a coleção completa, ou é indispensável para quem curte o estilo e/ou a banda. E as outras quatro categorias? Com as plataformas de streaming, você pode conferir o disco e aí concordar ou discordar. No entanto, sempre que puder, compre o produto físico e original. Quem faz música e vive dela agradece.

The Night Flight Orchestra – Sometimes the World Ain’t Enough

Por Daniel Dutra | Fotos: Emelie Lager/Divulgação (capa) e Carlos Holmberg/Divulgação (interna)

The Last of the Independent Romantics é uma música com muitos elementos progressivos, no sentido de que há surpresas e mudanças em seu andamento. É para mostrar do que a banda é capaz, porque sempre vamos além daquilo que decidimos fazer. Se você tenta adivinhar o que virá a seguir, será novamente surpreendido”, disse Björn “Speed” Strid, durante o bate-papo que resultou na entrevista que está na edição 235 (agosto) da Roadie Crew, ao comentar a canção que encerra Sometimes the World Ain’t Enough. “O elemento surpresa é sempre algo muito bonito, mas precisa fazer sentido, e ela faz sentido. Leva você a uma viagem, porque é praticamente um álbum inteiro numa única música. É muita longa, mas com várias nuances que servem para tirar o fôlego, porque nossa ideia era deixar o ouvinte se perguntando ‘Que diabos aconteceu?’ assim que ela e, consequentemente, o disco acabam.”

E há uma razão muito boa para começar desta maneira, meio que pelo fim, a resenha do novo álbum do The Night Flight Orchestra: o vocalista e seus parceiros de crime – David Andersson (guitarra), Sharlee D’Angelo (baixo), Richard Larsson (teclados), Sebastian Forslund (percussão e guitarra) e Jonas Källsbäck (bateria) – conseguiram novamente. Basta uma audição de Sometimes the World Ain’t Enough para você se pegar pensando como é possível os caras terem feito um trabalho ainda melhor que o espetacular Amber Galactic (2017). Pois bem, um ano depois, eles fizeram. O que surpreende em The Last of the Independent Romantics é o progressive AOR, porque não há maneira melhor de definir os nove minutos de uma canção recheada de belas passagens instrumentais, incluindo solo de teclado e um fim acústico com violoncelos.


Tudo com aquela aura mágica dos anos 80 que permeia todo o CD, mas ainda assim uma música diferente das demais. Como a primeira faixa, a empolgante This Time, mais rock’n’roll, empolgante como os solos de piano e guitarra. Ou como o molho extra que as vozes de Anna-Mia Bonde e Anna Brygård dão a Turn to Miami, um baita AOR levado pelos teclados, a Moments of Thunder e ao lado groove e hard rock da faixa-título. Groove, aliás, que é mérito total de D’Angelo, que brilha como nunca antes, porque é surpreendente e muito agradável ouvi-lo tocando com os dedos e emprestando um suingue formidável a Paralyzed, uma daquelas canções nascidas de alguma inspiração divina. Que refrão absurdo!

É tão maravilhoso quanto os de Speedwagon e Can’t Be That Bad, joias que têm nas contagiantes Barcelona e Winged and Serpentine, ambas mais AOR com hard rock, semelhantes do mesmo quilate. Aí você que ainda não ouviu o CD pode pensar que não dá para ficar melhor. Sim, dá. Pretty Thing Closing in é a união perfeita de AOR com disco music, e Lovers in the Rain… Meu amigo, que música é essa!? Hino ou hit, como queira, ela seria um sucesso gigantesco 30 anos atrás, e isso diz muito sobre o NFO, a melhor banda surgida nos anos 2000, e Sometimes the World Ain’t Enough, o álbum de 2018. Porque, acredite, a música tem salvação.


Faixas
1. This Time
2. Turn to Miami
3. Paralyzed
4. Sometimes the World Ain’t Enough
5. Moments of Thunder
6. Speedwagon
7. Lovers in the Rain
8. Can’t Be That Bad
9. Pretty Thing Closing in
10. Barcelona
11. Winged and Serpentine
12. The Last of the Independent Romantics

Banda
Björn “Speed” Strid – vocal
David Andersson – guitarra
Sharlee D’Angelo – baixo
Richard Larsson – teclados
Jonas Källsbäck – bateria
Sebastian Forslund – percussão e guitarra
Anna-Mia Bonde – backup vocal
Anna Brygård – backup vocal


Lançamento: 29/06/2018

Produção: The Night Flight Orchestra
Mixagem: Sebastian Forslund

Dee Snider – For the Love of Metal

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

É compreensível que We Are the Ones (2016) tenha incomodado tanto os fãs de Dee Snider. Esperava-se que o primeiro disco do solo do vocalista depois do fim definitivo do Twisted Sister fosse na linha de Never Let the Bastards Wear You Down (2000); talvez algo na veia do Widowmaker, independentemente se mais tradicional como Blood and Bullets (1992) ou moderno (para a época) como Stand By for Pain (1994); de repente um resgate do infelizmente esquecido Desperado; ou até mesmo um álbum na praia da sua ex-banda. Mas não foi, e ele avisou que não seria – e convenhamos: apesar da desnecessária releitura de We’re Not Gonna Take it, não estamos falando de um CD que o gato cheira e joga terra em cima.

Enfim, se os fãs queriam heavy metal, então foi isso que eles ganharam, porque For the Love of Metal é o melhor disco de heavy metal de 2018. Curiosamente, um trabalho que conta apenas com a grife do vocalista, uma vez que todas as composições giram em torno de outros três nomes: o vocalista do Hatebreed, Jamey Jasta, que produziu o trabalho; o baterista Nicky Bellmore (Toxic Holocaust), coprodutor e responsável pela mixagem; e o guitarrista e baixista Charlie Bellmore, integrante do Kingdom of Sorrow ao lado do próprio e do irmão Nicky. Ou seja, uma nova experiência para Snider, acostumado a compor as músicas e escrever as letras basicamente sozinho. Assim, o que ele fez? Deixou o som do trio ainda mais poderoso com sua personalidade e uma performance avassaladora.


Pegue Lies Are a Business, que abre o CD: começa rápida e termina cadenciada, e no meio de tudo isso há riffs em profusão. Mais do que isso, dá para escutá-la imaginando Snider ensandecido em cima do palco. Assim como na maravilhosa Tomorrow’s No Concern, feita para machucar pescoços e cantar o refrão com os punhos para cima. Os caras acertaram tanto a mão na hora de compor que a letra de I Am the Hurricane, exatamente na ponte para o refrão, tem um “I am a force of nature” que é cara de Dee Snider, um dos maiores frontmen da história do rock – e ótimo vocalista, é bom ressaltar para os desavisados.

Se você está se perguntando se a pegada aqui é mais moderna, por causa do time que criou as canções, saiba que é isso mesmo. Mask carrega esses elementos para além da produção (repare no refrão), e The Hardest Way, com a participação de Howard Jones (Light the Torch, ex- Killswitch Engage), é o principal exemplo. No entanto, o pula-pula no fim de American Made não é nada que o próprio Twisted Sister não tenha feito um sem-número de vezes, assim como a levada contagiante e a pegada nervosa de Roll Over You (que riff!) e de Running Mazes sempre foram uma referência na carreira de Snider.

Esse apelo a uma nova geração, digamos assim, está na participação de Alissa White-Gluz (Arch Enemy) em Dead Hearts (Love Thy Enemy), que começa acústica, com a vocalista cantando limpo, e depois vira heavy metal de primeira grandeza – e a combinação das vozes de Alissa e Snider ficou muito, muito boa. Ou seja, não há nada a temer. Além de tudo isso, se o fã quiser metal dos anos 80, I’m Ready está aqui para agradá-lo; se quiser reviver aquele lado mais acessível e hard rock do Twisted Sister, Become the Storm tem jeitão de hit e um dos melhores refrãos do álbum; e se quiser um hino, então pode ficar com a faixa-título. Pesada, melódica e também moderna, For the Love of Metal, a música, é uma declaração absolutamente verdadeira. E quem gosta de heavy metal tem que reverenciar Dee Snider. Mais uma vez.


Faixas
1. Lies Are a Business
2. Tomorrow’s No Concern
3. I Am the Hurricane
4. American Made
5. Roll Over You
6. I’m Ready
7. Running Mazes
8. Mask
9. Become the Storm
10. The Hardest Way
11. Dead Hearts (Love Thy Enemy)
12. For the Love of Metal

Músicos
Dee Snider – vocal
Charlie Bellmore – guitarra e baixo
Nicky Bellmore – bateria


Convidados especiais
Alissa White-Gluz – vocal (faixa 11)
Howard Jones – vocal (faixa 10)
Joey Conception – guitarra (faixa 6)
Tanya O’Callaghan – baixo (faixas 5 e 10)

Lançamento: 27/07/2018

Produção: Jamey Jasta
Mixagem: Nicky Bellmore (coprodutor)

Red Dragon Cartel – Patina

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Quando Jake E. Lee apareceu no videoclipe de We Come Undone, do Beggars & Thieves, no fim de 2011, a reação foi tão positiva que os fãs passaram a sonhar com a possibilidade de ele sair do exílio e voltar a fazer música. Efetivamente, porque o guitarrista não lançava nada desde Retraced (2005), o álbum de covers que não o tirou de casa, assim como seu primeiro disco solo, o instrumental A Fine Pink Mist (1996), também não o fez voltar aos palcos. Tirando uma ou outra aparição surpresa e relâmpago em Las Vegas, onde reside, Lee estava longe dos holofotes e do grande público havia quase 20 anos.

Mas aquele clipe e um empurrãozinho de Kevin Churko e de Ronnie Mancuso – produtor e guitarrista/baixista do Beggars & Thieves, respectivamente – deram resultado: três anos depois, Lee estava de volta com o Red Dragon Cartel. No entanto, se você torceu o nariz para o homônimo disco de estreia, que chegou às lojas em 2014, saiba que Patina é exatamente o que o single/videoclipe Havana entregou: um Jake E. Lee old school, à la Badlands. E não foi apenas a sonoridade mais moderna que ficou para trás, porque a produção de primeira também remete ao passado, com um toque especial de Max Norman na mixagem – ele e Lee trabalharam juntos em Bark at the Moon (1983), de Ozzy Osbourne.


Apoiado por uma nova e ótima cozinha – Anthony Esposito (baixo, ex-Lynch Mob e Ace Frehley) e Phil Varone (bateria, ex-Skid Row) –, o gênio das seis cordas fez um álbum para emocionar o fã. E o início do álbum é arrasador: Speedbag tem nuances de guitarra que vão muito além do ótimo riff palhetado, além de um trabalho tribal bem interessante de Varone; e Havana entrega mais um riff sensacional para rivalizar com o solo debulhador, cheio de feeling e com direito a wah-wah no fim. As duas apontam o caminho pelo qual seguem mais algumas canções empolgantes: Bitter, com um baita riff funkeado, e Punchclown, que mostra a todos como esse cara toca bonito demais…

Aliás, Lee se divide entre largar os dedos no braço da guitarra – ouça The Luxury of Breathing, que tem algo de Dusk (1998), as demos do que seria o terceiro trabalho do Badlands, mas que acabaram virando CD anos depois – e mostrar um feeling de arrepiar, como na bonita A Painted Heart, que destaca também as linhas de baixo – vale ressaltar: Esposito coproduziu o disco e coescreveu as músicas com Lee, ou seja, virou o homem de confiança do chefe. Mas, no geral, o trabalho de guitarra tem tantos detalhes que vale ouvir o álbum com fones de ouvido. Experimente fazer isso nas ótimas Crooked Man, mais arrastada, e My Beautiful Mess, com toques de psicodelia.

No entanto, é a excelente Ink & Water que melhor ilustra o trabalho de Lee no disco: com toques de jazz e surf music, também pede a ouvidos mais atentos a percepção de uma das técnicas peculiares do guitarrista: criar melodias batendo com os dedos da mão direita nas cordas logo acima dos captadores, como em Fool Like You, de The Ultimate Sin (1986), seu último trabalho com Ozzy. Ah, e não pense que esqueci: tão criticado, especialmente por causa de sua péssima estreia ao vivo, Darren James Smith segue no comando do microfone, mas parece outro vocalista, mais seguro, confiante mesmo. Ouça a belíssima Chasing Ghosts, na qual ele gravou várias camadas de voz, e entenda por que Lee insistiu em mantê-lo. Valeu a pena. O novo Red Dragon Cartel e Patina não são o Badlands – nunca qualquer outra coisa será –, mas é um lindo presente de um dos melhores e mais criativos guitarristas do hard rock.


Faixas
1. Speedbag
2. Havana
3. Crooked Man
4. The Luxury of Breathing
5. Bitter
6. Chasing Ghosts
7. A Painted Heart
8. Punchclown
9. My Beautiful Mess
10. Ink & Water

Banda
Darren James Smith – vocal
Jake E. Lee – guitarra
Anthony Esposito – baixo
Phil Varone – bateria


Lançamento: 09/11/2018

Produção: Anthony Esposito e Jake E. Lee
Mixagem: Max Norman

Electric Boys – The Ghost War Diaries

Por Daniel Dutra | Fotos: Divulgação

Depois de Starflight United, minha expectativa para o novo disco do Electric Boys atingiu índices estratosféricos. Culpa de Conny Bloom (vocal e guitarra), Franco Santunione (guitarra), Andy Christell (baixo) e Niclas Sigevall (bateria), que fizeram o melhor álbum de 2014 – a banda agora conta com um segundo baterista, Jolle Atlagic, que tocou com Bloom e Christell nos últimos dois anos de vida do Hanoi Rocks, em 2008 e 2009 (o vocalista e guitarrista estava ao lado de Michael Monroe na lendária banda finlandesa desde 2004, e o baixista, desde 2005). Mas os caras conseguiram de novo, e The Ghost War Diaries vicia mais que assistir a séries no Netflix.

Arrasa-quarteirão movido a riff e refrão matadores, Hangover in Hannover começa quebrando tudo, mas aí a banda resolver apelar ainda mais com três joias: There She Goes Again tem um refrão tão bom, mas tão bom que merece até momento solo, com a voz de Bloom e os vocais de apoio num acento até gospel; a radiofônica You Spark My Heart seria um enorme hit se o mundo fosse justo; e Love is a Funny Feeling é uma aula de funk metal com direito a orquestração e backing vocals femininos fabulosos, cortesia de Anna Thorsson-Foyen e Annie Kratz-Gutå. É inacreditável como esses caras fazem músicas empolgantes, e só essas quatro já valeriam o CD, mas a peteca não cai de jeito nenhum.


Tente resistir a Gone Gone Gone, por exemplo. Ela ameaça uma balada, mas embala com uma guitarra cheia de suingue, aquele Hammond bem encaixado, muito de Beatles e uma seção instrumental bem anos 70 durante o solo. E por falar nos Fab Four, ouça Knocked Out By Tyson e imagine como seria se Paul, John, George e Ringo caíssem no funk rock. E First the Money, Then the Honey? Mais uma canção cheia de groove e com refrão pegajoso, feita para dançar e pular. Calma que tem mais: Rich Man, Poor Man mistura o lado acústico do blues, com direito a uso do slide, com o groove do funk, resultando num refrão típico do Electric Boys – ou seja, formidável –, mas com algo de Aerosmith.

Com riffs de guitarra e de baixo grudentos, até a instrumental Swampmotofrog é para chacoalhar o esqueleto Aliás, é como se ela fosse a continuação de Sometimes U Gotta Go Look for the Car, do excelente And Them Boys Done Swang (2011), só que trocando a letra (apenas o título da música cantado algumas vezes por Bloom) por novos elementos musicais, como um pouco de progressivo. E assim como Starflight United tem um desfecho épico, com 59 High Mountain St., o novo álbum não fica para trás: música mais longa do CD, One of the Fallen Angels carrega passagens mais intimistas e tem um fim meio fantasmagórico. Desde a sua volta à ativa em 2009, com a formação original e depois de um hiato de 15 anos, o Electric Boys não erra uma. Na boa, pare agora o que você está fazendo e vá atrás de The Ghost War Diaries.


Faixas
1. Hangover in Hannover
2. There She Goes Again
3. You Spark My Heart
4. Love is a Funny Feeling
5. Gone Gone Gone
6. Swampmotofrog
7. First the Money, Then the Honey
8. Rich Man, Poor Man
9. Knocked Out By Tyson
10. One of yhe Fallen Angels

Banda
Conny Bloom – vocal e guitarra
Franco Santunione – guitarra
Andy Christell – baixo
Niclas Sigevall – bateria (faixas 1, 2, 3, 5, 6, 7 e 10)
Jolle Atlagic – bateria (faixas 4, 8 e 9)

Lançamento: 23/11/2018

Produção e mixagem: David Castillo